A Ofensiva do MinoTaurus: Austeridade, Armamentismo e Plutocracia || A Casa de Vidro

A OFENSIVA DO MINOTAURUS
Por Renato Costa & Eduardo Carli

O filme de terror que não sai de cartaz no Brasil de 2019 evoca a lembrança do mito grego do Minotauro. Este ser de natureza híbrida entre o humano e o bestial, encerrado dentro do labirinto do rei Minos de Creta, devorava ano a ano jovens atenienses entregues, como tributo em carne viva, ao feroz paladar da besta – até ser chacinado pela expedição de Teseu e Ariadne (saiba mais sobre este mito).

Aquilo que poderíamos chamar de massacre dos inocentes, para lembrar o título de uma obra do sociólogo José de Souza Martins, está funcionando a pleno vapor nesta época de predomínio da extrema-direita. Um símbolo deste predomínio é o monstro papavidas, a besta necrofílica, que aqui cognominamos MinoTaurus.

No Brasil, um dos piores exemplos da Ofensiva do MinoTaurus é a empresa brasileira de armas e munições que, sob a batuta Bolsonarista, está contente de obter lucros estratosféricos com a venda dos instrumentos da morte violenta: a Taurus já é a 4ª empresa no mercado armamentista dos EUA, onde está sendo denunciada e processada por vender armas com defeito (que no Brasil já ocasionaram 50 mortes). Em sua campanha eleitoral, Bolsonaro foi garoto propaganda da Taurus, apesar da fraude internacional de 600 milhões de reais envolvendo os seus controladores.

Uma reportagem do The Intercept Brasil, Um Monopólio Que Mata, destrinchou que “armas defeituosas da Taurus matam impunemente, blindadas pelo lobby e pelo Exército”. Chegando ao poder, Jair Bolsonaro publicou o Decreto Nº 9.785, de 7 de maio de 2019,  que a princípio muito bem recebido pela empresa.Sinal de que o MinoTaurus se assanhou com gozo foi a reação do presidente da empresa armamentista,  Salesio Nuhs, em entrevista ao Correio Brasiliense:

“A Taurus entende que o decreto assinado pelo presidente da República Jair Bolsonaro poderá aumentar de forma relevante a procura por armas de fogo pelos caçadores, atiradores e colecionadores (CACs) e cidadãos de bem para sua legítima defesa e da propriedade. O Decreto é um marco neste seguimento e a Taurus está pronta para atender todo o aumento de demanda.” Porém, recente reportagem de Brasil de Fato, publicada em 22 de Maio de 2019, traça um quadro das tensões do Bolsonarismo com o monopólio armamentista da Taurus. Seja como for, com a extrema-direita Bolsonarista no poder, estamos claramente diante do triunfo de Tânatos sobre Eros  e da ascensão de uma perversa e nefasta Necropolítica.

O catastrófico crash do capitalismo globalizado em 2008 inaugurou uma era de hegemonia de uma “ideia perigosa”: a austeridade. Segundo o cientista político escocês Mark Blyth, da Brown University, “a austeridade é a penitência – a dor virtuosa após a festa imoral -, mas não vai ser uma dieta que todos partilharemos. Poucos de nós são convidados para a festa, mas pedem-nos a todos que paguemos a conta.” [1] Ao estudar a evolução da perigosa noção de austeridade, desde a época de Locke, David Hume e Adam Smith até chegar nos neoliberais como Hayek e Milton Friedman, o autor tenta provar que a austeridade simplesmente não funciona.

Neste artigo, propomos uma análise da ofensiva desta Besta a partir de três de suas cabeças: a austeridade, o armamentismo e a plutocracia. Três elementos que se explicitam quando atentamos para o noticiário, repleto de notícias sobre cortes no financiamento público de políticas sociais (a exemplo do atual corte de recursos para a rede federal de educação, imposto pelo MEC, e que sofreu a histórica resistência tsunâmica do Maio de 2019); sobre o libera-geral das armas de fogo e da violência policial genocida (sendo que Bolsonaro, Moro e Witzel agem como necro-políticos que fazem a festa dos lucros de empresas como a Taurus); sobre um projeto de reforma da previdência que impõe a vontade da plutocracia e faz com que o Estado brasileiro fortaleça sua insana tendência a ser um Robin Hood às avessas.

VÍDEO RECOMENDADO: Mark Blyth on Austerity

Grande conhecedora da obra de Blyth, e autora do prefácio de seu livro, a economista Laura Carvalho é uma das vozes mais fortes a esclarecer a opinião pública no Brasil sobre um monstro que vem sendo chamado de “Robin Hood às avessas”, outro dos cognomes do nosso “MinoTaurus”.

Em seu livro Valsa Brasileira, Laura Carvalho escreveu:

Em uma sociedade como a nossa, que nunca deixou de estar entre as mais desiguais do mundo, a opção por medidas de redução estrutural da rede de proteção social, em vez da via da tributação mais justa e do fortalecimento do Estado de bem-estar social, reforça uma abordagem exclusivista e punitivista da marginalidade social.

A proteção aos mais vulneráveis sempre pode caber no Orçamento, mas o genocídio jamais caberá na civilização. Enquanto a insustentabilidade do sistema previdenciário em meio à elevação da expectativa de vida for vista pela maioria como mais dramática do que a insustentabilidade de um sistema penitenciário em meio à produção de um número cada vez maior de excluídos, estaremos condenados à barbárie. – CARVALHO, Laura. “Valsa Brasileira – Do Boom Ao Caos Econômico”. Editora todavia, 2018. Pg. 157 a 159. [2]

Na esteira de Blyth, Carvalho dá um excelente exemplo de austeridade à brasileira ao lembrar de uma fala de Michel Temer, uma das piores expressões do capitalismo austero, que em abril de 2017, em defesa da PEC do teto de gastos públicos, disse que  “governos precisam passar a ter maridos” [2].

Ou seja, o governo é aí enxergado pelo viés masculinista: o Estado deve ser controlador como um “patriarca”, um maridão que fala grosso e controla com mão de ferro a economia doméstica fazendo uso de um instrumento supremo: a tesoura. Cortes e cortes e mais cortes nos serviços públicos é o que prega esta governamentalidade neoliberal colonizada pela noção de Estado mínimo. 

Austeridade, conceito de teor moral (e moralista) aplicado ao âmbito da economia capitalista globalizada pós-crise (o crash de 2008 é considerado o pior desde a Grande Depressão iniciada em 1929), é um elogio hipócrita do recato feito por homens que já se esbaldaram até o excesso na ganância e no financeirismo plutocrático.

Austeridade é a máscara de moralidade que visa vestir o capitalismo financeiro: “Em última análise”,  escreveu John Cassidy em The New Yorker, “a economia não pode ser divorciada da moral e da ética. A falha da austeridade não é apenas uma questão de decepção com PIB e déficits. É uma calamidade humana, e uma que poderia ter sido evitada.” [3]

No Brasil, uma das mais importantes iniciativas em prol do debate sobre austeridade são os livros publicados pela Editora Autonomia Literária, em parceria com a Fundação Perseu Abramo e Partido dos Trabalhadores, que integram o selo “ECONOMIA DO COMUM: ANTIAUSTERIDADE”. Após a crise de 2008, uma das piores de toda a história do capitalismo, muitas corporações capitalistas, em especial as financeiras, que colapsaram e quase foram à falência, foram resgatas da bancarrota com dinheiro público…

“A ‘reestatização’ dos bancos aplicou um socialismo ao avesso, onde socializavam os prejuízos nas costas dos 99% enquanto capitalizavam os lucros no bolso do 1%. O aumento da desigualdade, do caos e as desastrosas consequências após o colapso deu fôlego a um novo ciclo de lutas e de ativismo a partir de 2011. (…) Confrontar o amargo remédio da austeridade no labirinto do caos deflagrado pela crise é pensar nas chaves para a construção de uma nova economia, desta vez a serviço dos 99%, do meio-ambiente e do bem-estar – em um momento de franco ataques aos direitos fundamentais aqui e mundo afora.” [4]

O “labirinto do caos” tem em seu centro um devorador MinoTaurus, servidor do 1%. Meio homem, meio touro, este híbrido de humano e bestial é um papa-gente insaciável. Que forças sociais seriam a reencarnação de Teseu e Ariadne? Que novelo de lã poderia nos ajudar a confrontar este monstro, cortar a cabeça medusante das austeridades neoliberais, e depois sairmos vivos do labirinto para seguir o trabalho de reconstrução do mundo?


Em seu livro “O Minotauro Global”, devotado à tarefa de analisar “A Verdadeira Origem Da Crise Financeira E O Futuro Da Economia Global”, o ex-ministro grego das Finanças no governo do Syriza, Yanis Varoufakis, um dos maiores expoentes antiausteridade na Europa, “destrói o mito de que a regulamentação dos bancos é ruim para a saúde econômica.” (Outras Palavras)

O aprofundamento da financeirização da economia global pós-2008 foi matéria de análise de Varoufakis neste seu paradigmático livro. “O Minotauro Global” reporta os efeitos da crise financeira de longo prazo e da consequente estagnação na economia de modo geral. O livro de 2011 já nos preparava para o ciclo de Crise (com c maiúscula, segundo o autor) que se estenderia ao longo desta década que se termina, e adiante, no alvorecer da década de 20, do século XXI.

George F. Watts (1877-86)

Segundo a metáfora proposta por Varoufakis, o mito do ser metade humano, metade touro, fruto híbrido de um adultério adultério mediado por Poseidon, o deus dos terremotos, o Minotauro seria uma forma acabada de se contrapor democracia e austeridade. O personagem labiríntico revelaria a incongruência entre o arrocho fiscal  – ou“teto de gastos” para o contingenciamento de 1 trilhão de reais, em prol do “equilíbrio das contas públicas”, leia-se pagamento da dívida pública, segundo proposta do Ministro das Finança brasileiro, Paulo Guedes – e um sistema político baseado nos direitos humanos.

A tese econômica que guia a metáfora da tributação de guerra exercido “sobre os vencidos” é a inferência de causalidade entre ajuste fiscal e guerra comercial, decorrendo em corrida militar supremacista, todas formas de promover e impor o arrocho das contas públicas em diferentes estados nacionais, invariavelmente plutocráticos, governados pela “elite do dinheiro”, a mando do capital financeiro especulativo.

O sistema de crédito corporativo internacional – representado por Wall Street e a sugestiva estátua do “touro em investida” – teria se transformado, em tempos de Crise, no grande ‘aspirador de pó’ dos excedentes produtivos internacionais que passaram a ser capitalizados através da compra de títulos da dívida pública estadunidense pelos países do mundo que precisam manter suas reservas em moeda forte, principalmente a China.

Entretanto, as mesmas operações que garantem o investimento de ativos à nível global; a supremacia cambial do dólar e o financiamento da dívida pública estadunidense, apesar da estabilidade precária de seus déficits gêmeos, comercial e orçamentário, garantem também que a crescente fome deste Minotauro por excedentes financeiros, promovendo o genocídio de jovens e emergentes empresas e economias nacionais, alimente a maior concentração de poder bélico e informacional jamais visto em uma estratégia totalitária de hegemonia geopolítica.

Essa estratégia teria criado este Minotauro financeiro, artífice de um Poder Global – empoderado pelo arbítrio da Reserva Federal estadunidense, que repassa às mega-corporações os ativos gerados através de créditos hipotecários de alto risco e altíssimo rendimento, as chamadas subprimes.  Altos riscos apenas até que estoure a bolha da inadimplência, o “risco” que é salvaguardado pelo contribuintes estadunidenses legitima a formação de imensas fortunas privadas, em último caso securitizadas pelo déficit fiscal que, por sua vez, é mantido pela dominação militar-financeira internacional. Os déficits gêmeos se retroalimentam: o desenvolvimento inter regional estadunidense se vale do déficit fiscal para promover instalações militares mundo afora, com produção fortemente protecionistas no registro de patentes de alto valor tecnológico vendidas na corrida internacional por armas e reservas em dólar americano.

Notadamente, os próprios títulos da dívida americana servem à equilibrar o déficit comercial crescente, mantido e legitimado pelo poder de arbitragem imperial, criando, assim, um ciclo potencialmente interminável, uma insaciável fome imperial pelos excedentes globais, que irão alimentar a própria dívida interna, a voracidade do Minotauro.

Através das projeções encasteladas de analistas ostentosamente céticos quanto a possibilidade mesma de segurança e arbitragem democrática dos investimentos públicos e da regulação da ganância privada, a fraude está completa e a guerra perpétua legitimada economicamente. Essa verdadeira ‘fraude dos doutos’, promovida  por economistas ‘ortodoxos’ a serviço de uma verdadeira joint-venture imperial, é artífice mitológica de um estado estendido, que entrega a soberania democrática dos povos a interesses econômicos particulares.

No Brasil e em toda parte em que se instala o arbítrio neoliberal das elites nacionais capturadas por sua renitente servidão voluntária, cria-se um simulacro de tragédia com roteiro fornecido não pelos gregos, mas sim pelo do Departamento de Estado dos Estados Unidos, versão armada de democracia-empresarial, anti-nacional, austericida, totalitária e surpreendentemente planetária. Democracias estão sendo abertamente saqueadas por uma política econômica a priori entreguista há muito arbitrada pelas atribuições públicas de Bancos Centrais privatizados que servem a repassar os custos da especulação financeira desenfreada às populações e ao setor produtivo.

   Constituída sua musculatura pela tendência concentradora do ‘imperialismo financeiro’ do dólar e pelo poder de ‘persuasão’ militar dos EUA, a fome da metade superior do Minotauro foi,  finalmente, responsável por suplantar consensos econômicos e políticos a nível planetário e agora metaboliza a excludente ‘democracia de cidadãos proprietários’ [6] que lhe deu suporte em ‘democracia militar’ com vistas ao espectro da total dominação (full-spectrum dominance/superiority); do poder solitário (lonely power) – segundo análise do cientista político brasileiro Moniz Bandeira em seu contundente livro A Desordem Mundial [7] – e prenunciado pelo pretendido excepcionalismo racista do ‘destino manifesto’ e reiterado pelo ‘patrioct act’.  

A versão dessa concentração financeira absolutista no século XX é atualizada pela ‘war on terrorism’, do presidente George W. Bush e de seu vice, o demente-mor, Dick Cheney.

A metade  mítica do touro em investida tem sua cabeça chafurdando na lama de fraudes financeiras de toda sorte. A Crise de 2008 pode ter sido, aponta Varoufakis, o tropeço que precede a grande queda do mundo unipolar há tanto anunciada. Portanto, um mundo multipolar se afirmar a cada investida em falso da ‘besta’ indomada: na tentativa de golpe na Venezuela; na ‘derrota por procuração’ na Síria; na anexação da Crimeia pela Rússia; além da crise diplomática generalizada e da mobilização popular anti-austeridade, crescentes em todas as partes do mundo.

Segundo M. Bandeira, através da Doutrina Monroe, professada pelo presidente Theodore Roosevelt em 1901, a a ‘corolária política’ do Big Stick ( traduzida singelamente como Grande Porrete sobre a mesa) promoveu os interesses estadunidenses na América Latina durante o seu american century (século americano), se valendo do provérbio africano que sugere diálogo com  suavidade, desde que garantida a posse de um grande porrete à mão. No início deste novo século, no país mais poderoso do planeta, reitera-se doutrinas diplomáticas abertamente colonialistas professadas há séculos, mas bizarramente encampadas ainda hoje.

Logo de ditaduras militares tuteladas terem aprofundado a dependência da região, hoje a violência e os traumas da ingerência reverberam no continente americano. A novidade agora é a extensão quase global e a projeção totalitária dessa política, contando agora com mais de 800 bases militares em todo o mundo, a maioria com ogivas nucleares; ciberataques a democracias não-alinhadas; espionagem internacional a líderes soberanos; extermínio de jihadistas e civis através drones, aeronaves não-tripuladas, tudo disposto à guerras comerciais e psicológicas à revelia do Direito Internacional, dos Direitos Humanos e dos escrúpulos éticos.

Uma military democracy orquestrada pela dominação da elite econômica transnacional emerge em solo estadunidense e nas diferentes zonas de influência dessa espécie mitológica de capitalismo financeiro autocrático e absolutista. Esse modelo de sociedade tem ainda, apesar da desterritorialização dos investimentos econômicos, seu centro de controle no complexo industrial-militar e financeiro estadunidense. A financeirização articulada com a indústria cultural-especular hegemônica promove os assédios do poder imperial americano com a ilusão da estabilidade do dólar e o sonho americano de um mundo colonial de consumidores ordeiros e conservadores, ávidos pelas patentes, pela cultura e pela moeda metropolitana.

* * * *

VÍDEOS RECOMENDADOS


BIBLIOGRAFIA

[1] BLYTH, Mark. Austeridade: A História de Uma Idéia Perigosa. São Paulo: Autonomia Literária, 2017.

[2] CARVALHO, Laura. Valsa Brasileira – Do Boom Ao Caos Econômico. Editora Todavia, 2018. Pg. 157 a 159. [2]

[3] CASSIDY, John. In: The New Yorker. apud BLYTH, 2017.

[4] AUTONOMIA LITERÁRIA. Apresentação do selo “Economia do Comum.” In: BLYTH, 2017, p. 8.

[5] VAROUFAKIS, Yanis. O minotauro global: a verdadeira origem da crise financeira e o futuro da economia global. Autonomia Literária, São Paulo, 2016.

[6] RAWLS, J. A theory of justice. 2 ed. Cambridge: Belknap Press, 1999.

[7] MONIZ BANDEIRA, Luiz Alberto. A desordem mundial: o espectro da total dominação: guerras por procuração, terror, caos e catástrofes humanitárias. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2016.

FIDEL CASTRO (1926 – 2016) – In Memoriam

HASTA SIEMPRE, FIDEL?
por Eduardo Carli de Moraes | Novembro de 2016

“E seus inimigos não dizem que apesar de todos os pesares, das agressões de fora e das arbitrariedades de dentro, essa ilha sofrida mas obstinadamente alegre gerou a sociedade latino-americana menos injusta.” – EDUARDO GALEANO
(Tradução de Eric Nepomuceno em Outras Palavras) – LEIA TUDO EM http://wp.me/p15fon-1UQy

Fidel se foi, sua fama e seus feitos ficam. Figura controversa, é claro: entre os pólos extremos da idolatria mais derretida e do rechaço mais furioso, perfilam-se as reações à morte de Fidel Castro após seus 90 anos na Terra.

De 1926 a 2016, realizou seu percurso de vida de modo tão fulgurante, tão marcante, que não há dúvida de que não será esquecido tão cedo. Esta segunda morte, o esquecimento, que a todos nós há de recobrir (em 5 milhões de anos, quem se lembrará de Napoleão ou Júlio César, de Jesus Cristo ou de Buda, de Cleópatra ou Marilyn Monroe?), demora mais a vir para estas figuras que adquiriram “estatura histórica”.

Fidel Castro, se não será esquecido, deve o mérito de seu destino memorável em especial às palavras e ações que dedicou aos olvidados da Terra, aos desvalidos, aos deserdados, às vítimas da exploração e da espoliação injustas – aqueles que Frantz Fanon chamou de Les Damnés de la Terre.

Se a chama de sua memória há de ser preservada viva por algum tempo, furtando-o de sumir por completo após os vermes terem devorado os últimos tecos de seu cadáver, será por ação de re-memora-ação admirativa e fiel daqueles cuja sina de opressão e miséria Fidel Castro lutou a vida inteira por revolucionar, alçando-os à dignidade humana de camaradas, irmãos de destino em uma sociedade mais fraternal.

A História o absolverá? Quem terá a temeridade presunçosa de dar resposta a uma questão destas? Quem são os juízes que tem o direito de sentar no tribunal da História e te julgar, comandante?

É curioso, quase engraçado, nestes dias que sucederam à morte de Fidel, notar o quanto a cyber-praça-pública foi tomada por pontífices da História e juízes da vida alheia, proclamando vereditos de Facebook sobre o tirano sanguinário ou sobre o herói revolucionário Fidel Castro. A demonização e a angelização são ambas encontráveis às mancheias, e é de se suspeitar que nenhuma nem outra faça justiça à vida de Castro que, como todo mundo, era humano, demasiado humano. 

De todo modo, mesmo aqueles que tacam pedras sobre a reputação de Castro não podem ignorar ou permanecer neutros diante de uma espécie de fato empírico de estranho tipo: o mundo sente que perdeu um ser humano que vai morar nos livros de História, que será incorporado àquela vasta galeria de personagens, através dos séculos, que realizou algo de inesquecível e inescapável em matéria de ação e reflexão no âmbito da política. Esta vida que se foi é incapaz de deixar o mundo indiferente à sua partida – eis o que ensina a tua morte, Fidel.

O que será feito de ti não está mais em teu controle. Nem no túmulo escaparás da polêmica, da qual nunca fugistes, aliás. Tua reputação póstuma também é um campo de batalha. E diante disso, por mais insignificante que eu seja, por mais pífio que seja meu poder, perfilo-me nas barricadas a teu lado, compañero. 

Pois a Revolução Cubana é, em política, uma inescapável estrela-guia para todos que lutam por sociedades menos injustas. Foi a prova viva de que era possível nos trópicos inventar uma civilização socialista bem naquele espaço que o arrogante Império havia se acostumado a pensar como seu chiqueiro, seu quintal, sua colônia de férias, seu cassino, seu vasto campo de exploração colonial.

Primeiro a Espanha, depois os Estados Unidos, as metrópoles fincaram suas garras ensanguentadas nesta ilha por tanto tempo infeliz, chorando as amargas lágrimas, no corpo de seu povo, pela escravidão, pela opressão, pela espoliação e injustiça sofridas (mas nunca consentidas). A ousadia dos guerrilheiros de Sierra Maestra, o triunfo da revolução, a caminhada difícil até a construção do socialismo, a resiliência e a coerência de um regime que se manteve fiel a seus princípios igualitaristas de justiça social, inspira milhares de ativistas até hoje, e talvez a morte de Fidel não vá causar o arrefecimento mas sim uma nova efervescência das idéias e práticas do “castrismo”.

Conheço o discurso do fora todos!, do não quero ter nenhum herói, mas às vezes isto soa-me, em política, como uma espécie de individualismo niilista, de indivíduo isolado que pensa poder prescindir de pessoas como inspiração e que, com seu ethos, no percurso de sua existência, fornecem motivações afetivas sem as quais a ação permaneceria apática, ineficaz.

Conheço – e adoro – aquelas canções punk anarco-autonomistas que, como diz o Stiff Little Fingers lá da Irlanda, exige: “no more heroes!”. Porém, não será quimérico querer uma política totalmente sem heroísmo, privada de heróis e vilões, sem lideranças nem liderados, na quimérica e perfeita horizontalidade homogênea?

Não estou defendendo o maniqueísmo, como visão-de-mundo, já que sua estreiteza e sua estupidez são explícitas: dividir a Humanidade entre dois grandes clubes, o das pessoas-de-bem e a dos endemoniados, a dos angelicais e a dos bestiais, as dos heróis aureolados e dos satanizados adversários, é algo tosco demais para precisar de demoradas refutações. Meu questionamento é outro: a mobilização coletiva poderá de fato algum dia prescindir da capacidade de mobilização que só é fornecida por “ideologias do heroísmo” e por líderes carismáticos com força mobilizadora?

É inegável, até como fenômeno sociológico empiricamente comprovável, passível de virar estatística e tudo, que há milhares de sujeitos que tem fome de heróis e encontram em Fidel Castro, em Che Guevara, no Subcomandante Marcos etc. figuras dignas de admiração. E mais que isso: quando digo admiração, não me refiro a qualquer tipo de contemplação passiva, em que alguém que ficaria boquiaberto e babando ovo para alguém, mas com a bunda bem sentadinha no sofá do conformismo e da inatividade.

Admiração, no caso, é uma espécie de força mobilizatória que impele o sujeito a realizar uma espécie de mímesis de seu herói adorado. Por mais que nos coloquemos, no debate teórico e intelectual, no lado materialista da barricada, enxergando nos idealistas aqueles que estão na ilusão e no equívoco, é bem difícil ser um materialista lúcido e negar que todo o “mundo simbólico” tem sim muitos efeitos históricos, e que entre estes eventos simbólicos está a idealização-de-outrem, a circulação social de ideias heróicos e as conexas mímesis de um ethos admirado, nunca estando excluída a necessidade de investigar o quanto as ideologias estão por trás daquilo que fomos ensinados a louvar ou a rechaçar. 

Eu provocaria dizendo que tem muito materialista, no âmbito teórico, que é um idealista na prática, pois todas as suas ações militantes são derivadas de uma força motriz “ideal” – que pode ser, por exemplo, a motivação de “brilhar no céu da história com o fulgor de Lênins, Fidéis e Ches”.

Talvez muito materialista, tendo se convertido ao ateísmo, precise de um substituto para os deuses do céu em que não crê, e por isso fabrique ídolos na Terra, ídolos que foram de carne-e-osso e que depois de mortos tornam-se emblema, símbolo, ausentes em corpo mas presentes na figura de um ideal que muitos sujeitos mantêm com a chama viva, alimentando-o com o sangue bombeado por seus próprios corações.

Que há nisso um elemento de idolatria, não tenho dúvida, mas será que seríamos Nietzschianos fiéis ao mestre se concluíssemos, com simplismo crasso, que é preciso condenar igualmente toda e qualquer idolatria, ao invés de perguntar: qual o valor de tal e tal sistemas-de-ídolos? Ele serva à vida ascendente na imanência, ou serve ao sacrifício da vida presente a uma quimera transcendente? Será que também Nietzsche não propôs uma reviravolta de heroísmos com sua transvaloração de todos os valores, uma proposta de que cessássemos com a idolatria do Nazareno em sua cruz e começássemos a nos mirar no exemplo de espíritos mais livres, dos Übbermench prenunciados pelas bacantes dionisíacas?

É porque sinto em mim uma vontade de celebrar com panegíricos a figura de Fidel Castro que me pus, neste texto, a refletir sobre idolatrias, seus perigos mas também suas promessas. Talvez possamos admirar e idolatrar de modo lúcido, sem cegueira, com empatia e camaradagem, mas nunca abdicando da autonomia de um senso crítico que foi ensinado a não se sujeitar a nenhum ídolo acima da verdade.

Sabemos, Fidel, que figuras como ti e Che não foram nem a perfeição encarnada nem os capetas assassinos que os mais tacanhos e estúpidos dentre teus adversários pintam que vocês foram. Nem anjos nem bestas, de todo modo lograram realizar algo que lhes trouxe amplo reconhecimento e celebridade.

Nós, os reles mortais, os olvidados, os que vivem na semi-sombra de um quase-anonimato, aqueles que não serão mencionados por seus nomes próprios em nenhum livro de História ou nenhum documentário, nós que suspeitamos que nosso destino post mortem será o rápido esquecimento, olhamos com inevitável admiração para teus feitos inolvidáveis. Não podemos esquecê-los, nem suportar calados e sem revolta aqueles que desejariam usar, contra vocês, a borracha. Ou o assassínio de reputação.

15178981_10205888645694176_2567812962823392543_n

"Esta noite milhões de crianças dormirão na rua. Nenhuma delas é cubana." - Ilustra por Vitor Teixeira

“Esta noite milhões de crianças dormirão na rua.
Nenhuma delas é cubana.” – Ilustra por Vitor Teixeira

II. DA GUERRILHA AO SOCIALISMO – A REVOLUÇÃO CUBANA

Gostaria de prestar tributo a Fidel evocando uma obra que muito me ensinou sobre ele e seu papel histórico: Da Guerrilha ao Socialismo – A Revolução Cubana, de Florestan Fernandes (ed. Expressão Popular):”Não importa o que se pense sobre ‘o papel do grande homem na história’, o fato contundente é que, sem Fidel Castro, a revolução cubana não teria ocorrido da forma histórica que a caracterizou. Por mais que esta revolução estivesse historicamente madura e fosse uma necessidade política, sem ele e o movimento castrista a ruptura com a ordem social neocolonial teria sido contida, de um modo ou de outro, no nível de uma composição nacional-burguesa mais ou menos conservadora e pró-imperialista.” (p. 119)

Sem Fidel Castro, a revolução cubana poderia não ter tomado os rumos do socialismo, do poder popular soberano, do anti-imperialismo radical, da defesa intransigente de uma espécie de soberania nacional libertária.

Segundo Che Guevara, Fidel Castro teria sido uma “força telúrica” da América Latina, alguém que nos momentos mais difíceis da Sierra Maestra tinha uma infatigável “grandeza humana e espírito revolucionário”, como fica patente pela seguinte narração de Che: “Uns 15 homens destruídos fisicamente e até moralmente, juntamo-nos e só pudemos ir adiante pela enorme confiança que Fidel Castro teve nesses momentos decisivos, por sua valorosa figura de chefe revolucionário e sua fé inquebrantável no povo” (CHE GUEVARA, “Proyeciones sociales del ejército rebelde”, In: CASTRO, La Revolución Cubana, p. 428, apud FERNANDES, p. 120).

O que Che enfatiza aqui é um fator que fazia parte da personalidade de Castro e que pôde incidir sobre toda a história do povo cubano: sua convicção inquebrantável de estar lutando pela causa do “povo”, em prol de uma revolução legítima e necessária, o que o convertia naquela fortaleza que fortalecia aqueles que sentiam-se tentados a desistir.

Sua estatura histórica é inseparável de sua capacidade de  mobilização popular, aquilo que trocando em miúdos podemos chamar de sua popularidade, mas é certo que Fidel Castro não foi meramente um mestre da retórica, da oratória, apenas um astuto demagogo. Fidel Castro foi um pensador político, um estrategista da práxis, um materialista de viés marxista cujo pensamento é muito digno de discussão e debates nas faculdades de sociologia e filosofia. Falemos um pouco sobre o que Florestan Fernandes considera ser a estratégia castrista:

 “Fidel Castro foi o estrategista da revolução cubana… deve-se à sua imaginação prodigiosa a criação de uma estratégia política que fez do movimento castrista uma vanguarda revolucionária e o converteu, aos poucos mas de maneira muito rápida, no verdadeiro pilar da revolução cubana. Tratava-se de uma estratégia muito simples e, também, muito ousada. (…) Os êxitos e os malogros do ataque ao quartel de Moncada, em 1953, permitiram que Fidel passasse do diagnóstico dos problemas cubanos e de seus remédios políticos para um exame em profundidade das relações entre meios e fins na luta revolucionária. A contra-revolução contava com o poder de repressão da ditadura, com recursos externos facilmente mobilizáveis…. Não havia como sair do impasse a curto prazo, o que determinou a aceitação da guerrilha como o meio principal de luta e a formação de um movimento político paralelo, cuja função inicial consistia em impedir o isolamento político da guerrilha.” (FLORESTAN FERNANDES, p. 121)

jose-marti-lo-derechos_0

Fiéis à tradição de José Martí, os revolucionários “castristas” acreditam que não se luta contra uma ditadura militarizada e sanguinária, sustentada por Yankees brutais, interessados na perpetuação da espoliação imperial e da dominação do povo nativo por um truculento Estado-títere, através do uso de rosas e carinhos, gentilmente cedidos aos poderosos, com os pedidos delicados de que abdiquem voluntariamente de praticar a opressão.

A guerrilha foi aceita como uma ferramenta em uma luta de libertação que não tinha nenhum tipo de particularismo estreito, uma luta revolucionária em prol da maioria do povo cubano, que deveria conquistar assim sua autêntica independência e soberania. Há um componente de indignação moral nos discursos e ações de Fidel Castro que é também, segundo avaliação de Florestan Fernandes, um dos fatores que fez dele uma tão potente liderança política:

“É fascinante a sagacidade com que Fidel Castro se moveu nesse complexo e movediço tabuleiro, lançando palavras-de-ordem diretas e concretas, muitas delas variavelmente pungentes, e que atendiam às frustrações de todas as classes ou respondiam, de uma ou de outra forma, a necessidades e aspirações sentidas nos diversos estratos dessas mesmas classes – nesse sentido, o centro de gravidade da revolução ficava, inicialmente, na libertação nacional.

Por sua vez, o ataque frontal contra a ordem foi montado em termos de condenação moral, esta sim, extremista e candente, mas também formulada em termos concretos: os excessos dos poderosos e da ditadura, os efeitos da espoliação extrema, os males da corrupção e da submissão aos interesses estrangeiros, os defeitos da concentração agrária, da monocultura, da dependência a um mercado etc. – nesse sentido, a unidade política da revolução procedia inicialmente de seu eixo democrático. (…) Como a Constituição de 1940 continha normais ideais que nunca seriam cumpridas, ela criava um espaço político legítimo e legal para todo o debate. Fidel Castro explorou com sabedoria esse espaço, afirmando-se através dele como o paladino do nacionalismo, da legalidade constitucional, do populismo e da democracia, tocando o coração de todos os cubanos e despertando nos destituídos uma nova esperança.” (FERNANDES, p. 123)

fidel-castro-new-5

É pela mobilização da indignação e da esperança da maioria da população da ilha que Fidel torna-se uma espécie de herói nacional, torna-se uma força histórica determinante, sem que com isso caiamos no simplismo de uma História que seja feita “de cima para baixo”, por inspiração ideal de um líder iluminado; na verdade, o inverso é que é mais real, pois a revolução cubana veio de baixo para cima, como a lava de um vulcão e não como uma dádiva dos céus, e se Fidel Castro teve papel-chave neste processo foi justamente por ter se colocado de pés bem firmes no solo concreto onde buscou a concretização de uma “organização revolucionária dos humildes, pelos humildes e para os humildes”, definição que ele propôs para o Movimento 26 de Julho (CASTRO, La Revolución Cubana, p. 110, apud FERNANDES, p. 137).

Longe de cairmos no personalismo populista (“um homem sozinho mudou a história de seu país”), afirmamos aqui que a erupção da rebeldia do povo espoliado e maltratado de Cuba foi o agente revolucionário supremo, mas que seria falsificação histórica passar uma borracha sobre a importância crucial, neste processo, de uma liderança como Fidel Castro, fundamental para a determinação dos rumos anti-imperialistas, autenticamente socialistas, da revolução cubana, que ao invés de tornar-se apenas uma “revolução dentro da ordem”, que desaguasse na sensaboria de um capitalismo modernizado e de uma democracia liberal burguesa, triunfou como “revolução contra a ordem”, com forte protagonismo dos proletários urbanos e camponeses, além da juventude radical e dos setores populares radicalmente anti-imperialistas:

“O antiimperialismo exigia, como algo inevitável, o anticapitalismo: não se poderia dar um salto histórico de um sem o outro e, portanto, impunha-se ir direto à concepção libertária e socialista de liberação nacional. (…) À medida que a desagregação da ordem social neocolonial se completa e as classes trabalhadoras passam da revolução dentro da ordem para a revolução contra a ordem, a socialização política do jovem radical sofre uma transmutação. Ele apanha essa potencialidade ainda no seu estado larval e avança através dela.

Por conseguinte, o jovem radical veio a ser um protagonista exemplar: veio a ser o sismógrafo das sucessivas alterações da situação revolucionária e o porta-voz das classes e estratos de classes especificamente revolucionários da sociedade cubana… O êxito militar dos jovens rebeldes, dos fins de 1957 em diante, deixara o campo político aberto para a eclosão das forças revolucionárias reprimidas nos confins da sociedade cubana. As classes trabalhadoras e os humildes foram deslocados para a condição de uma retaguarda mobilizada e militante… Atinge-se, então, o clímax da socialização política produzida e a consciência revolucionária do jovem rebelde traduz não só as exigências da ‘revolução nacional’ e da ‘luta antiimperialista’, mas a própria consciência da classe trabalhadora, que emerge como a classe revolucionária, e seu poder real, o poder popular.” (FERNANDES, p. 109)

Revolucionários

Cuba, em 1959, conseguiu dar o salto para além de seu sequestro pelo imperialismo: de “satélite” dos Estados Unidos, ilha-monocultora, exportadora de açúcar e de frutas, com condições de trabalho mantidas em níveis próximos à escravidão, como foi durante as ditaduras de Machado e Batista, a ilha salta para o socialismo libertário que de imediato pratica a reforma agrária e várias medidas redistributivas.

Obviamente, a revolução cubana ocorre em um contexto internacional tanto de Guerra Fria, com a polarização entre EUA e URSS, mas também das lutas pela descolonização na África, o que possibilitou que a luta em Cuba pudesse, apesar de visceralmente nacionalista, estar também conectada à janela histórica de “inclusão de Cuba nas correntes históricas da época do socialismo” – “o que estava em jogo, desse ângulo, era o grau de liberdade de Cuba de saltar da descolonização para a autodeterminação propriamente dita. (…) A situação mundial criara espaço histórico para que uma pequena ‘nação problema’ da América Latina ousasse ir tão longe desafiando o colosso e derrotando-o.” (FERNANDES, p. 145-143)

O colosso – no caso, os EUA, o gigante que Cuba tinha a poucas milhas de seu território – não só foi enfrentado com braveza, foi sim derrotado, não só pelo fracasso da contra-revolução financiada por Washington e pelo desastre que foi a tentativa de invasão da Baía dos Porcos, mas também pois a construção do socialismo cubano mostrou que era viável uma via autônoma, independente, soberana, mesmo na vizinhança do colossal império capitalista anglo-saxão.

Florestan diz que “a idéia de que um extenso e profundo  desenvolvimento capitalista prévio é indispensável  ao êxito da revolução socialista  faz parte de arraigados mitos eurocêntricos de nossa época” (p. 148), mas que na verdade é planamente possível passar “direto” do status de colônia monocultora sob o jugo das metrópoles imperiais espoliadoras, para o status de nação que se autodetermina em prol da invenção de um socialismo dos trópicos, antes e independente de qualquer modernização capitalista. O Tio Sam não perdoaria fácil a ousadia da Ilha insurgente.

“Onerando a revolução cubana com o peso da terrível guerra econômica, política e militar que lhe moveu de forma impiedosa e prolongada” (p. 149), os EUA no entanto não teve sucesso em impedir o florescimento da nova sociedade socialista em Cuba. Neste seu livro, publicado em 1979, aos 20 anos da revolução, Florestan Fernandes pondera:

“Já se disse que Cuba não poderia socializar mais que a miséria. Nestes últimos 20 anos Cuba fez mais que isso, o que exige que se retome a crítica desse julgamento cruel. Graças ao socialismo, em apenas 20 anos, Cuba realizou uma reforma agrária que se inscreve na história das grandes realizações que ocorreram na América Latina no século 20; retirou a maioria de sua população, os setores mais pobres dos proletários rurais e urbanos, da situação crônica de condenados da terra, assegurando-lhes meios permanentes de trabalho, um padrão sóbrio mas decente de vida, e a possibilidade de viver como gente; suplantou um dos mais terríveis cercos capitalistas e deixou definitivamente para trás o complexo colonial…” (p. 150)

falando-a-multidao-num-longuissimo-discurso-na-praca-da-revolucao-havana

Fidel Castro falando à multidão, num longuíssimo discurso na Praça da Revolução, Havana

CONTINUA…

LEIA TAMBÉM:

* * * * *

GALERIA FOTOGRÁFICA:

161126-fidelsamambaia-485x312

Na Sierra Maestra

com-angela-davis-e-malcolm-x-na-foto-acima-durante-uma-visita-aos-eua

Com Angela Davis durante visita aos EUA

com-ernest-hemingway-um-dos-poucos-norte-americanos-que-permaneceu-em-cuba-apos-a-revolucao

Com Ernest Hemingway

fidel-castro-era-apaixonado-por-beisebol-na-foto-ele-joga-em-uma-escola-de-formacao-de-professoras-em-sierra-maestra-em-1962

Fidel Castro era apaixonado por beisebol. Na foto, ele joga em uma escola de formação de professoras em Sierra Maestra em 1962. – BBC

com-o-primeiro-ministro-sueco-olof-palme-o-lider-mais-ousado-da-social-democracia-europeia

Com o primeiro-ministro sueco Olof Palme

com-simone-de-beauvoir-e-jean-paul-sarte-nos-primeiros-anos-da-revolucao

Com Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sarte, nos primeiros anos da revolução [COMPARTILHAR]

com-salvador-allende-na-breve-aventura-do-poder-popular-chileno

Com Salvador Allende, presidente do Chile, derrubado e morto pelo golpe de Estado em 11 de Setembro de 1973

fidel-com-a-guerrilheira-celia-sanchez

Fidel com a guerrilheira Celia Sánchez

malcolm-x

Com Malcolm X

1989

8 de Janeiro 1989: uma pomba branca pousa nos ombros de Fidel Castro enquanto ele discursa em comemoração aos 30 anos da Revolução.

1989-gorbachev

03 de Abril de 1989: com Mikhail Gorbachev, em Havana

dez-1995

Dezembro de 1995 – Visita à Grande Muralha da China

2010

03 de Setembro de 2010, Universidade de Havana

2012

Fidel Castro no lançamento de uma biografia escrita por Katiuska Blanco. 03 de Fevereiro de 2012.

che-2

Só sorrisos com Che Guevara

body_fidel-castro_1

Na Sierra Maestra

che

Com Che Guevara, que tenta jogar golfe (aparentemente sem muito sucesso e com muito desengonço…)

fidel-castro-1

Maio de 1963: Fidel Castro e Nikita Khrushchev, visita oficial do líder cubano a Moscou

Final Phase Digital
fidel_castro_-_mats_terminal_washington_1959

julho-de-1968

5 de Julho de 1968: Fidel Castro mostra uma fotografia em que o General Ovando Candia e outros membros do Exército Boliviano celebram o assassinato de Che Guevara.

hugo-chavez

13 de Agosto de 2006 – Presidente da Venezuela, Hugo Chávez, visita Fidel em Havana

lula

Fidel Castro Com Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil

julho-de-1963

Julho de 1963: Fidel Castro depõe após ser preso pelo ataque ao Quartel Moncada – Santiago de Cuba. A intenção era armar a população e derrubar o governo de Fulgencio Batista. Por ser advogado, pronuncia sua auto defesa diante do tribunal, que passará a ser conhecida como “A História me Absolverá”, frase com a qual conclui sua auto defesa. Após um ano de detenção, sai em liberdade, anistiado em 1955, e exila-se no México. Volta a Cuba desta vez com Ernesto Che Guevara, Camilo Cienfuegos e Raul Castro , num total de 83 homens a bordo do iate Granma e inicia a guerrilha contra o regime desde a Sierra Maestra a 2 de Dezembro de 1956. Inicia-se assim a Revolução Cubana que em 1 de Janeiro de 1959 triunfaria contra Batista.

A ex-presidente Dilma Rousseff visitou Fidel Castro em Havana em 27 de janeiro de 2014. Na ocasião, a imprensa oficial cubana disse que o encontro "foi uma expressão do afeto e da admiração entre Fidel e Dilma".

A ex-presidente Dilma Rousseff visitou Fidel Castro em Havana em 27 de janeiro de 2014. Na ocasião, a imprensa oficial cubana disse que o encontro “foi uma expressão do afeto e da admiração entre Fidel e Dilma”. – BBC

nelson-mandela

2 de Setembro de 1998, com Nelson Mandela, no 12th Non-Aligned Movement Summit, Durban

papa-chico

Em Havana, com o Papa Francisco (o argentino Jorge Bergoglio), em 20 de Setembro de 2015.

sankara

Fidel Castro com Thomas Sankara, presidente de Burkina Faso e conhecido como “Che Guevara” da África

mandela

Com Nelson Mandela

amilcarcabral

Com Amilcar Cabral, líder na luta por independência da Guiné Bissau e Cabo Verde

samora-machel_mocambique

Com Samora Machel, líder da Guerra da Independência de Moçambique. Se tornou o seu primeiro presidente de 1975 a 1986.

COMPARTILHAR GALERIA NO FACEBOOK

* * * * *

BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA:

ignacio-ramonet

a-ilha
bandeira
capa-castro-bx
frei
tariq-ali


9781473607064_z
fidel-e-cheCOMPRE NA LIVRARIA A CASA DE VIDRO: “Fidel e Che – uma Amizade Revolucionária, de Simon Reid-Henry”. a história do filho de um camponês, estudioso e rebelde – Fidel Castro – e da sua amizade com o médico Enesto “Che” Guevara. Ainda muito jovens, e ambos no exílio, encontraram-se na Cidade do México, em 1955. Em 1967 Che Guevara foi morto. Ao longo dos seus doze anos de amizade tornaram-se duas das figuras mais incontornáveis do século XX. O livro segue Fidel e Che desde a sua dramática jornada política no México, à guerra nas montanhas cubanas, até ao ponto alto da Guerra Fria. O autor baseia-se em pesquisas de arquivos em Havana, Washington, Moscovo, Miami, Princeton, Boston, Londres, Berlim, e também em entrevistas com alguns dos maiores protagonistas nesta história. Simon Reid-Henry, estudioso da Revolução Cubana,  é professor de geografia na Universidade de Londres. Livro novo, em perfeito estado, 575 pgs. [COMPRE AQUI – Ed. Globo, 2010, novo, 575 pgs, R$47,90]

 

* * * * *

FILMOGRAFIA RECOMENDADA:

soy_cuba

SOY CUBA, Um filme de Mikhail Kalatozov (1964). BAIXAR TORRENT. COMPARTILHA NO FACEBOOK.


fidel_3d_hr

FIDEL, um doc Saul Landau (1971)


dvd-memorias-cubanas-papa-e-fidel-frente

MEMÓRIAS CUBANAS – Uma série de docs de Gianni Minà


oliviercomandante_org

south_of_the_border


FIDEL! (2002), de David Attwood

FIDEL! (2002), de David Attwood

* * * * *

OUTROS VÍDEOS RECOMENDADOS:

Histórico diálogo entre Fidel Castro y Salvador Allende (Completo) – 53 min

COMPARTILHAR NO FACEBOOK


Marcos, aqui estamos! – Da série de docs Memórias Cubanas de Gianni Minà


Fidel no Congresso da UNE – Belo Horizonte – 1999


Roda Viva – TV Cultura – 1990


COMPARTILHAR

* * * * *

5 CANÇÕES