TSUNAMI DA BALBÚRDIA: Documentário sobre a mobilização em defesa da Educação pública em 15 de Maio de 2019 (Goiânia, 23 min)

“Se ele nos chama de idiotas úteis, eu digo que na presidência tem um idiota inútil.” – Guilherme Boulos (MTST/Povo Sem Medo/PSOL)https://bit.ly/2WKoe3j

Éramos mais de um milhão de pessoas, em mais de 200 cidades, participando do Tsunami da Educação e “protestando contra o avanço da barbárie”, como bem definiu Bob Fernandes. Éramos aqueles que não serão feitos de otários pela enganosa retórica do “são só 3 chocolatinhos que vocês vão deixar pra comer depois” (discurseira devidamente detonada pelo sarcasmo salutar de Gregório Duvivier no episódio B de Balbúrdia do Greg News).

Éramos, no #15M, um rio de gente, de uma diversidade pulsante, numa explosão de colorido indomável. Um pouco deste caleidoscópio humano está encapsulado no filme que agora lançamos, no calor da hora. Tsunami Da Balbúrdia, documentário curta-metragem produzido por A Casa de Vidro (veja no Youtube, no Vimeo ou no Facebook),  é o primeiro passo em um processo criativo mais amplo, que une os aspectos cinematográfico, jornalístico e político, visando à produção de um longa-metragem sobre o Tsunami da Educação em 2019 (auxilie no financiamento colaborativo e deixe um troco na nossa Vakinha!).


Filmado durante as manifestações goianienses do 15 de Maio, Tsunami da Balbúrdia está em sintonia com os ideais e as práticas do jornalismo Ninja. Nesta obra – com montagem, som direto e direção de Eduardo Carli de Moraes (professor de filosofia do IFG)buscamos amplificar a voz e disseminar as mensagens dos manifestantes através do audiovisual.

Contribuindo tanto para o registro histórico deste evento político quanto para o incentivo ao prosseguimento das mobilizações no futuro próximo (o 30 de Maio e o 14 de Junho sendo as datas de iminente grandiosidade e relevo histórico). A obra contêm, além dos agitos de rua e de um registro da assembléia geral unificada dos DCEs do IFG e da UFG, entrevistas e depoimentos de:

* Frank Tavares (prof. de Sociologia da UFG)
* Angela Cristina Ferreira (da Comissão de Direitos Humanos Dom Tomás Balduíno)
* Dalmir Rogério Pereira (Prof. de artes na EMAC/UFG)
* Mateus Ferreira (Estudante de Ciências Sociais / UFG)
* Renato Costa (Ativista e Estudante de Jornalismo / UFG), dentre outros.

Agrademos o apoio, na produção, de Lays Vieira e Frederico Monteiro. Na trilha sonora, canções de Dani Black e convidados (“O Trono do Estudar”), The Interrupters (“Babylon”), Moska e Rennó (“Nenhum Direito a Menos”), Chico Buarque (“Apesar de Você”).

Éramos aqueles que sabem muito mais do que “qual o resultado de 7 vezes 8” e “qual a fórmula química da água”. Aqueles que sabem da nossa responsa diante do desmonte e do sucateamento que o governo Bolsonaro planeja impor. Aqueles que estão conscientes dos impactos catastróficos acarretados pelos cortes de cerca de 30% nos investimentos discricionários do Ministério da Educação (MEC), ainda mais quando sabemos que as 10 melhores universidades do Brasil são públicas e gratuitas. Aqueles que sabem que balbúrdia mesmo é o que faz no país este péssimo governo.

Somos aqueles que, ao contrário do Bozo e seus lacaios, não somos nem idiotas nem analfabetos políticos: sabemos que os cortes incidem sobre hospitais e centros de excelência em atendimento psicológico à população; sabemos também que, ao contrário da asneira presidencial de louvor às faculdades privadas, 95% da pesquisa científica brasileira ocorre em universidades públicas (é só jogar no Google, seu ministro!):

Antes de dizer que universidades são “balbúrdias” e não geram pesquisas, titular do MEC deveria se informar: Brasil é o 13º na produção de artigos científicos – e participação das públicas representa 95% – LEIA O ARTIGO EM OUTRAS PALAVRAS

Excelentes vídeos já foram publicados para esclarecer a opinião pública sobre os acontecimentos recentes no que tange às políticas públicas educacionais no Brasil e a resistência cívica que elas vem encontrando: acesse o material recomendado em BBC News, Brasil de Fato e Levante Popular da Juventude.

 

O histórico 15 de Maio de 2019 marca um ponto alto na curva das mobilizações populares no Brasil nestes tempos sombrios de predomínio da “necropolítica”, esta fusão entre neoliberalismo e neofascismo que hoje nos desgoverna com a perversa tesoura da Austeridade em mãos (aquela que corta da população para manter a mamata das elites).

Éramos, nas ruas, e seremos nas ruas do futuro, aqueles que não foram estupidificados por fake news no Whatsapp e estamos cientes de nossa responsabilidade histórica na defesa dos bens comuns. O “contingenciamento” que o (des)governo busca impor não é uma medida isolada, mas soma-se às tendências do ultradireitismo bozorista que consegue a educação como espaço a ser militarizado, “expurgado” de esquerdistas, “higienizado” contra o “marxismo cultural” e a “ideologia de gênero”, contra o pensamento crítico propulsionado por filósofos e sociólogos, por historiadores e pedagogos Paulo Freireanos…

Enfim, a extrema-direita hoje empoderada sonha com a Escola reduzida a apêndice servil do Mercado, onde reinariam supremos os valores evangélicos, as fardas dos milicos e os testas-de-ferro “apartidários” do Escola Sem Partido.

Foi o mais amplo e significativo movimento de massas desde o ELE NÃO de 2018 – o levante mais importante a marcar o processo eleitoral do ano passado, repleto de fraudes, de “laranjal do PSL”, de #Caixa2DoBolsonaro pra disseminação de fake news calúnias. Primeiro processo eleitoral pós-Golpe, corroído em sua legitimidade pela desleal e ilegal lawfare que aprisionou o candidato Lula, criminosamente privado de sua liberdade num contexto em que todas as pesquisas indicavam que venceria o pleito.

Reativando afetos e práticas que deram o tom do #EleNão, a galera na rua esbanjou irreverência. “Ô Bolsonaro, seu fascistinha! A estudantada vai botar você na linha!” Com essas e muitas outras rimas, os estudantes bradaram pelas ruas – e Maio de 2019 já possui o mérito maravilhoso de ter oferecido a muitos de nós um gostinho de Maio de 1968, um sabor da Paris em insurreição.

A golpes de rimas, os criativos protestadores diziam: “ô Bolsonaro, seu fanfarrão! Balbúrdia é cortar da educação!” Fanfarrão, pois Bozo insiste na discurseira contra a balbúrdia. Tanto o Chefe quanto seu serviçal Weintraub – o cara dos “três chocolatinhos e meio” – insistem na ideologia “balburdiana”, que supostamente dominaria nas universidades públicas. Estas são pintadas pelos bullys do Bozonistão como antros de comunistas, marxistas culturais, feminazis abortistas, queers Marielleanos, todos alimentados com mortadela, pelo PT e pelo PSOL, para disseminar o evangelho satânico do comunismo gayzista que virá colonizar a pátria com seus kits gays e suas mamadeiras de piroca.

Contra tal delírio do poder no Bozonistão, os estudantes e professores, os servidores técnico-administrativos e os cientistas, os artistas independentes e os empresários-de-si-mesmos que estão insatisfeitos contra o precariado do Uberismo, as mães que querem creches para os seus filhos e os pais que querem bolsas para seus filhos, crianças e idosos (e todas as faixas etárias entre eles) juntaram-se para bradar legítimas insatisfações contra os desrumos das coisas.

ÁLBUM FOTOGRÁFICO DO ATO EM GOIÂNIA

Empunhavam escudos-livros e lanças-lápis, como fez a “Tropa” da EMAC/UFG em sua performance em pleno protesto aqui em Goiânia. Uma potência expressiva que certamente agradaria a Judith Butler, uma das mais brilhantes pensadoras do mundo e que acaba de publicar um belíssimo livro de resistência e solidariedade chamado Corpos em Aliança.

Nossos mortos querem que lutemos, nossos mortos pedem que cantemos. E nós mandamos nosso recado: Paulo Freire, presente! Marielle, semente! E cá estamos, corpos aliançados, na luta unida contra a tirania dos idiotas inúteis.

Se o presidente da república não estivesse ocupado em tacar as pedras de seu desdém elitista contra os jovens que estavam bradando nas ruas, talvez pudesse, ao invés de xingar-nos de “idiotas”, ficar calado e ter a humildade para aprender. Mas seria pedir demais desta arrogância brucutu, de quem acha que tudo se resolve no tiro, que pudesse haurir um pouco disto que temos de sobra no âmbito social da Educação: a humildade para aprender e a disposição para reconhecer que somos todos incompletos, inconclusos, aprimoráveis.

Nesta inconclusão aberta ao aprimoramento, nesta humildade aberta ao convívio e ao aprendizado, aí está a raiz que alicerça toda a prática educativa, mas nosso presidente não consegue aprender e talvez morrerá um completo analfabeto em relação às práticas de um autêntico Estadista atento ao bem comum e ao coletivo bem viver. A isto, o apologista da tortura, dos grupos de extermínio e do “fuzilar a petralhada” é completamente cego.

Infelizmente, Bolsonaro é um “analfabeto educacional”, nunca aprendeu nada que prestasse sobre a importância da educação no mundo, e é o perfeito exemplar do idiotes dos grego – aquele que só enxerga, em sua semi-cegueira, os interesses privados e nunca o bem comum. Ao xingar os manifestantes de “idiotas”, desconhecendo completamente a etimologia da palavra original grega, Bolsonaro demonstra que em sua boca é a linguagem que está indo pro pau-de-arara.

Quem esteve no #TsunamiDaEducação é justamente o oposto do significado de “idiota”, e o próprio Bolsonaro ao dizer que “queremos uma garotada que comece a não se interessar por política” é que demonstra seu plano de construir uma educação idiotizante – à sua imagem e semelhança. Vejam a esclarecedora palestra de Mário Sérgio Cortella:

Se Bozo tivesse a modéstia de pôr-se na posição do aprendizado, descobriria quanta esperteza e inteligência, quanta solidariedade e esforço por justiça, pulsa nas ruas e nas redes, expressando-se atualmente nestes que constituem as vastas teias da Resistência a seu desgovernado projeto de tirania.

Acima: manifestações de massa levam mais de 1 milhão de pessoas às ruas. Fotos acima tiradas nas cidades de Goiânia, Rio de Janeiro, Curitiba e São Paulo.

Em EL PAÍS Brasil, Juan Arias escreve:

“Ao menos desta vez, o poder de turno no Brasil entendeu a mensagem oculta levada pelos quase um milhão de jovens estudantes que no último dia 15 saíram às ruas em 26 Estados e em centenas de cidades para defender o ensino contra quem deseja barbarizá-lo. Cansados de serem vistos como o futuro do país, que nunca chega, os jovens decidiram ser o presente e participar de sua construção.

O novo Governo pretende transformar o ensino, da escola primária à Universidade, para livrá-lo da ideologia esquerdista que, segundo ele, o havia desviado de seus valores tradicionais. O ensino que o novo poder pretende impor deve estar isento de debate político, de diversidade de ideias, dominada por um pensamento único, que, como nos melhores fascismos do passado, é imposto pelo Estado.

Uma escola em que não se perca tempo estudando o que depreciativamente chamam de “ciências humanas”. Nada de filosofia, que obriga a pensar e a questionar o poder, ou de sociologia, que abre os olhos para o abismo das desigualdades. Uma escola em que os alunos se transformem em guardas que vigiem e denunciem os professores se tentarem falar de política ou de sexo, ou das dores do mundo. A escola é moldada pelo poder. Os alunos escutam e se calam.

Contra o perigo desta nova era de obscurantismo educacional que o Governo deseja impor, com uma nova cruzada contra os livros e as ideias enquanto exalta as armas que pretende distribuir como doces, os jovens ocuparam pacificamente as ruas e praças do país, para desafiar quem tenta castrar seu direito à liberdade de expressão e impor suas ideias.”

Já o professor de Ciência Política da UnB Luis Felipe Miguel aponta: “Bolsonaro, em Dallas, desfia os impropérios de sempre contra estudantes e professores. Mas eu sei que ele está com medo. Que ele olhou na internet as manifestações enormes de Norte a Sul no Brasil e sentiu medo da nossa força. Que ouviu o pessoal gritando Bolsonaro, seu fascistinha, a juventude vai botar você na linha, engoliu em seco e pensou que não era uma bravata vazia.

Movido por sua própria arrogância e delírio, o governo errou: agrediu, insultou, provocou até que sacudiu a anestesia em que estávamos imersos. Para quem esteve na rua ou mesmo acompanhou de fora, os atos de hoje fizeram redobrar o ânimo de luta. Se esse ânimo se estender pela classe trabalhadora – e há indícios de que esta é uma possibilidade palpável – teremos uma greve memorável no dia 14 de junho e poderemos empunhar com esperança a bandeira da resistência: “Nenhum direito a menos”. >>> https://bit.ly/2w4yxn6

Por sua vez, o jornalista Leonardo Sakamoto escreve em seu blog no UOL duras e justas críticas ao governo Bolsonaro: “Ao atacar quem está indo às ruas pedir educação de qualidade, interdita o debate sobre a construção do futuro e põe a democracia no pau de arara. Estudantes que resolvem refletir e se organizar pela melhoria da educação não são ‘idiotas’, nem ‘imbecis’. Pelo contrário, reside neles a esperança da criação de uma nova forma de fazer política – ao contrário dos simulacros toscos que se chamam de “novo” mas cheiram a anacronismo. Burrice é atacar esses estudantes por medo da realidade mudar…”.

“A vida deu os muitos anos da estrutura
Do humano à procura do que Deus não respondeu.
Deu a história, a ciência, a arquitetura,
Deu a arte, deu a cura, e a Cultura pra quem leu.
Depois de tudo até chegar neste momento 
Me negar Conhecimento é me negar o que é meu.

Não venha agora fazer furo em meu futuro
Me trancar num quarto escuro
E fingir que me esqueceu!
Vocês vão ter que acostumar:

Ninguém tira o trono do estudar,
Ninguém é o dono do que a vida dá!
E nem me colocando numa jaula
Porque sala de aula essa jaula vai virar!

E tem que honrar e se orgulhar do trono mesmo!
E perder o sono mesmo pra lutar pelo o que é seu!
Que neste trono todo ser humano é rei,
Seja preto, branco, gay, rico, pobre, santo, ateu!
Pra ter escolha, tem que ter escola!
Ninguém quer esmola, e isso ninguém pode negar!
Nem a lei, nem estado, nem turista, nem palácio,
Nem artista, nem polícia militar!
Vocês vão ter que engolir e se entregar:
Ninguém tira o trono do estudar!”

Como professor do IFG, nos últimos anos pude vivenciar de dentro o que significam para o país os Institutos Federais, que atualmente constituem um patrimônio do povo brasileiro que merece ser defendido por todos os seus cidadãos conscientes de seu papel da salvaguarda dos bens comuns.

Para ilustrar o mérito dos IFs, vale lembrar que em 2016, ano em que findou prematuramente via golpeachment o governo de Dilma Rousseff, um fenômeno fascinante se explicitou através dos resultados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), realizado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE): caso os alunos dos IFs fossem considerados como porta-vozes da educação no Brasil, o país seria o 4º melhor do mundo na área (Saiba mais em The InterceptEl País).

“Na contramão do resultado geral obtido pelo País, que aponta pouca evolução nas áreas avaliadas ao longo dos anos, a pontuação das instituições federais de ensino no exame supera a média nacional e aproxima-se daquelas alcançadas por países desenvolvidos.

Cerca de 23 mil estudantes brasileiros, com idade entre 15 e 16 anos, das redes de ensino municipal, estadual, federal e privada participaram da avaliação, que contempla as áreas de matemática, ciências e leitura. As notas gerais alcançadas pelo Brasil, considerando-se a pontuação média das quatro redes de ensino, foram de 401 pontos em ciências; 407 pontos em leitura; e 377 pontos em matemática. Em todas elas, o país ficou abaixo da média geral Pisa, que foi de 493 em ciências, 493 em leitura e 490 em matemática. A análise dos resultados específicos da rede federal, no entanto, aponta um cenário diferenciado, que aproximaria o Brasil do topo do ranking: 517 pontos em ciências, 528 em leitura e 488 em matemática.

O desempenho positivo dos alunos da Rede Federal destaca-se, sobretudo desde 2009, na esteira da revitalização e expansão da Rede. Nesse ano, a média da nota dos alunos da Rede Federal atingiu 535 em leitura, principal área de concentração daquela edição. Com essa média, os alunos da Rede Federal teriam ocupado a 4ª posição no ranking, atrás apenas de Xangai (China), Coréia do Sul e Finlândia.

Para o coordenador de Formulação e Supervisão de Políticas para o Ensino Técnico do IFMG, Lucas Marinho, se, como se propõe, o Pisa fornece um importante parâmetro para avaliação e monitoramento da qualidade das políticas públicas em educação, esses resultados evidenciam que as escolas da Rede Federal, apesar da sua tão recente reestruturação e expansão, já despontam como o mais acertado esforço do Estado brasileiro para a promoção de uma educação de qualidade.

“E isso não por qualquer reforma especialmente complexa ou arrojada, mas por que veio constituindo-se até aqui, de acordo com algumas diretrizes óbvias que, infelizmente, têm sido sistematicamente ignoradas nas redes municipal e estadual de educação: investimento público suficiente para assegurar instalações adequadas; gestão autônoma e democrática; professores trabalhando, em sua maioria, em regime de dedicação exclusiva à mesma escola, bem remunerados e bem formados, numa carreira atrativa e bastante concorrida”, avalia Lucas.

Instituto Federal de Minas Gerais

É com arte e criatividade, corpos em aliança, solidariedade de existências, que caminhando e cantando entoaremos, como outrora, “afasta de mim esse cale-se!” e “quem sabe faz a hora não espera acontecer”, como agora, “tira a mão do meu IF!”, “ninguém solta a mão de ninguém”, “nenhum direito a menos”!

Bem-vindos ao Tsunami da Educação. Em breve ele vai atravessar com suas ondas indomáveis muito mais do que timelines e grupos de Whatsapp. Pois as margens que comprimem este rio são muito violentas, e assim nossas águas conjuntas ao invés de lago se estão fazendo tsunami. Em sintonia com a crise climática do global heating e em compasso com Greta Thunberg e com os “Pinguins” Chilenos, na sabedoria que Bertolt Brecht já ensinava:

Eduardo Carli de Moraes, Goiânia, 17/5/19

SAIBA MAIS:

O RUGIDO DAS RUAS – Por Bob Fernandes

METEORO: A BALBÚRDIA COMEÇOU

Lula é a prova viva de que não se pode encarcerar sonhos

Sinto e confesso que, diante de uma figura como Lula, sinto todo o peso de minha pequenez e insignificância. Pois Lula é um daqueles raros seres humanos que agigantou-se a ponto de transformar-se em figura histórica. Transcendeu as limitações da carne e ascendeu ao reino dos mitos. É hoje o que merece ser chamado pelo adorável clichê: uma lenda viva. 

Nesta ano de 2018, Lula evidenciou novamente sua imensa grandeza – que contrasta de modo gritante com a pequenez e a baixeza do presidente eleito Jair Bolsonaro, que é uma encarnação do que este país produziu de pior e de mais monstruoso em sua história. Vão acusar-me de maniqueísta e fanático ideológico, mas falo a partir de jorros afetivos do coração: estou plenamente convicto que Bolsonaro, que idolatra Ustra e Duque de Caxias, que defende a tortura e enaltece a ditadura, é de fato um monstro em comparação com este sábio que Lula tornou-se. 

As adversidades da vida ensinam muito mais que sucessos e glórias. E foi nas adversidades, desde o berço pernambucano até a migração para terras paulistas, que forjou-se este mito de carne-e-osso que atende por Lula e que, como a História do futuro dirá, merecerá estar inscrito na aventura do caminhar desta nação em posição equiparável a Tiradentes, a Lampião, a Antonio Conselheiro, a Prestes, a Marighella. Comparável, lá fora, a Mandela, a Gandhi, a Luther King. Sem deixar de ser absolutamente singular, idiossincrático, inimitável – um cara que poderia perfeitamente cantar “só eu sou eu” com toda a razão deste mundo. Não há personalidade pública que rebrilhe no Brasil da atualidade com tamanha singularidade. 

Só em dias extraordinários é oferecido a alguém a experiência de ver a cidade em que cresceu transformar-se no epicentro de um drama nacional e planetário. Foi o que ocorreu em Abril de 2018, quando a São Bernardo do Campo de minha infância e adolescência estava bombando em todas as mídias. Os olhos do mundo estavam focados no épico que se desenrolava no ABC paulista enquanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagia à iminência de seu encarceramento.

Nascido em 1984, eu não estava ainda entre os vivos quando explodiram, no fim dos anos 1970, aquelas colossais greves operárias que colocariam o governo ditatorial brasileiro em xeque. Acredito, porém, que as ressonâncias daqueles eventos me atingiram na infância, crescendo no ABC dos anos 1980 em meio aos antagonismos sociais violentos desta país que, desde que me entendo por gente, reconheço como uma tragédia de dimensões continentais. Um barril-de-pólvora em formato de país, onde a injustiça triunfa, a violência se alastra e “quem não presta fica vivo, quem é bom mandam matar” (para lembrar os versos de Cecília Meireles que Chico Buarque musicou).

No vídeo incrível da Mídia Ninja (assista a seguir), temos acesso a um condensado audiovisual de alto calibre com algumas das palavras históricas de Lula, em 07 de Abril de 2018, diante da multidão que estava diante do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, antes de ser encarcerado injustamente. Naquela ocasião, segundo Rosane Borges, professora da ECA-USP, “ouvimos um discurso fundador que se inscreveu irrevogavelmente na lápide da História”:


“Seja pela vocação que têm para suscitar outros / novos modos de existência, seja por instituírem novas configurações da política, seja por inventarem novas bússolas para a travessia de nossas vidas, alguns discursos se consagraram na História como prenúncio ou advento de um novo tempo, apesar dos perigos.

Num amplo arco, recordemos, entre tantas, algumas falas de repercussão sísmica, como o audacioso discurso ‘E eu não sou uma mulher?’, da estadunidense Sojourner Truth, ex-escravizada que demoliu a Women’s Rights Convention, em Ohio. Na ocasião, 1851, Truth questionou por que as mulheres brancas eram privilegiadas e as mulheres negras vistas como inferiores, intelectual e fisicamente, úteis somente para o trabalho braçal.

Menção obrigatória deve ser feita também ao discurso de posse de Nelson Mandela. No mesmo diapasão, está o discurso memorável de Martin Luther King (“Eu tenho um sonho”).

O celebrado “Saio da vida para entrar na História”, redigido na última linha da carta-testamento de Getúlio Vargas, é outro fragmento discursivo com desdobramentos importantes (…), escrito horas antes dele [Vargas] se matar, em 24 de agosto de 1954.

(…) Reafirmando que é dono do seu destino, Lula fez um discurso antológico em 7 de Abril de 2018. Um discurso indutor de esperanças várias, como um rio com múltiplos afluentes. Lula provocou estímulos inabarcavelmente amplos. (…) Quando Moro anuncia que ‘já era’ para Lula, eis o que o ex-presidente inverte, com seu pronunciamento, os elementos dessa equação, e anuncia que na verdade tudo só está começando. ‘A partir de agora minhas ideias vão se misturar com as ideias de vocês’.

Rosane Borges arremata: “Foram necessárias apenas 48 horas de nossas vidas – entre 5 e 7 de Abril de 2018, em São Bernardo do Campo/SP – para que testemunhássemos, em meio à politização do Judiciário, ao triunfo do Estado de exceção, um gesto de altíssima envergadura, vocalizado por um discurso emancipatório, o que fez desses 2 dias um marco temporal com potência para desbloquear o amanhã, interceptado que está pela política destruidora do presente que avança na velocidade da luz.” (BORGES, 2018, pg. 82 a 88)

Já a psicanalista Maria Rita Kehl pode dizer que testemunhou as duas prisões de Lula: enquanto repórter do jornal Movimento (de oposição à ditadura militar e ligado ao PC do B), ela conheceu o jovem líder operário Lula em 1978, quando o futuro presidente “foi o negociador entre operários e patrões na greve da Scania – a primeira greve operária desde o famigerado AI-5”.

Como rememora Kehl: “No ano seguinte, 1979, o movimento grevista se estendeu para um número grande de fábricas , em todo o ABC. No dia 1º de Maio de 1979, tive a sorte de ir, com amigos, à festa dos metalúrgicos. Ouvi Lula falar para 80 mil operários em greve, reunidos no estádio da Vila Euclides. Explicou, com clareza científica, as razões da greve. Não apostava na ‘condução das massas’ e sim na politização esclarecedora. O trabalhador que entende por que luta sabe o que reivindica e luta melhor…

Em agosto daquele ano, a lei da anistia permitiria a volta dos exilados e a liberdade dos presos políticos que ainda permaneciam encarcerados. Foi o começo do fim da ditadura. O movimento operário do ABC teve papel importante para que isso acontecesse.

Em 1980, Lula fundou o PT – Partido dos Trabalhadores, ao lado de outras lideranças operárias e um time de intelectuais progressistas de primeira linha: Antonio Candido, Sérgio Buarque de Holanda, Francisco de Oliveira, Marilena Chauí, Paulo Freire, Mário Pedrosa, Hélio Pellegrino, Lélia Abramo, Perseu Abramo. Intelectuais que não se pretendiam ‘condutores do povo’; ao contrário, apoiavam a criação de um partido que nascia de dentro da luta de classes.

Foi preciso esperar mais de 20 anos para que o país elegesse o melhor presidente de sua história.” (KEHL, pg. 39 e 40)

Neste ano de 1980 em que nasce o PT, ocorreu algo fenomenal no mês de Abril: no estádio municipal da Vila Euclides, em São Bernardo, uma “greve de metalúrgicos, dezenas de milhares de operários presentes à assembléia num campo de futebol”. Camilo Vanucchi relembra: “No alto, dois helicópteros riscavam o céu. Eram helicópteros do Exército. Nas portas, soldados empunhavam metralhadoras apontadas para a massa. Opressão contra resistência pacífica. Se um único disparo fosse feito, o que poderia acontecer? (…)

Um dos filhos de Lula, Marcos Cláudio, aos 9 anos de idade, voltou para casa impressionado e desenhou um daqueles helicópteros do Exército. A IstoÉ de Mino Carta publicou. Marisa contava com tristeza do impacto da prisão de Lula na vida de Marcos, o primogênito. Sofreu bullying na escola, duas décadas antes da popularização da palavra bullying: ‘Teu pai está preso porque é bandido. Se fosse honesto, não estava preso.’ Marcos ficou quase dois meses sem ir à escola e precisou repetir o ano.


38 anos depois, saquei o smartphone e registrei os helicópteros de 2018. Havia pouca diferença entre aquelas imagens tão distantes no tempo entre si. Do alto, a transmissão feita pela Globonews e reproduzida no Jornal Nacional nos atingia a todos com a mesma violência das metralhadoras apontadas para a multidão no estádio da Vila Euclides – hoje Estádio Primeiro de Maio, sede do São Bernardo Futebol Clube. A qualquer momento, as câmeras suspensas deflagariam tiros letais, como os tantos disparados contra nós ao longo de todos esses anos. Bastaria ajustar o calibre-diafragma, definir o gatilho-obturador, escolher a teleobjetiva mais adequada para os tiros de longo alcance. O bombardeio entraria ao vivo, em horário nobre. Sem silenciador.” (VANNUCHI, p. 65)

O bombardeio midiático antipetista preparou o terreno para a 2ª prisão de Luiz Inácio, 38 anos após ele ter ido parar no DOPS em 1980. O clima de fascismo se acirrou desde o processo contra Dilma Rousseff, que derrubou-a do poder em 2016, e o encarceramento de Lula era o telos de todo esse processo, a cereja do bolo golpista, a “consumação do golpe”. E assim foi.

O que o processo eleitoral nos ensinou através de sua amarga escola foi o nível bestial a que podem descer alguns de nossos condidadãos, ainda que se auto-intitulem “cidadãos-de-bem”: ao se entregar à polícia, Lula voou numa aeronave onde ouviram-se frases como “manda este lixo janela abaixo aí”. Um dito em consonância com a personalidade autoritária atroz de Bolsonaro, que quer condecorar com medalhas aqueles fardados que praticarem chacinas nas favelas ou nas manifestações populares, afinal não passam de marginais vermelhos e matáveis terroristas toda essa corja do PT, do MST, da UNE, do MTST…. 

Recusando o discurso do ódio, Lula falou ecoando Pablo Neruda, e Salvador Allende, e Che Guevara: “eles podem cortar todas as flores, mas não vão deter a primavera.” É preciso aprender com a primavera, que a cada mudança de estação vê-se despida e outonal, só para retornar plena e viçosa na próxima temporada. Aos juízes que agem como algozes e enforcam a Justiça em praça pública, ao presidente eleito com fraudes e calúnias e seu Ministério de Bandidos, à parcela da população que abraçou o fascismo e a intolerância, é preciso gritar em alto e bom som: ainda que vocês realmente façam como Bolsonaro pregou e deixem o Lula para “apodrecer na cadeia”, com o beneplácito do Batman dos Coxinhas (o Sr. Moro), cedo ou tarde descobrirão que os nossos sonhos não são encarceráveis. Se o inverno é de vocês, a primavera será nossa.

“Eu sou um construtor de sonhos. Eu há muito tempo atrás sonhei que era possível governar esse país envolvendo milhões e milhões de pessoas pobres na economia, envolvendo milhões de pessoas nas universidades, criando milhões e milhões de empregos nesse país. Eu sonhei que era possível um metalúrgico, sem diploma universitário, cuidar mais da educação que os diplomados e concursados que governaram esse país. Eu sonhei que era possível a gente diminuir a mortalidade infantil levando leite feijão e arroz para que as crianças pudessem comer todo dia. Eu sonhei que era possível pegar os estudantes da periferia e colocá-los nas melhores universidades desse país para que a gente não tenha juiz e procuradores só da elite. Daqui a pouco vamos ter juízes e procuradores nascidos na favela de Heliópolis, nascidos em Itaquera, nascidos na periferia. Nós vamos ter muita gente dos Sem Terra, do MTST, da CUT formados. 

Esse crime eu cometi.

Eu cometi esse crime e eles não querem que eu cometa mais. É por conta desse crime que já tem uns dez processos contra mim. E se for por esses crimes, de colocar pobre na universidade, negro na universidade, pobre comer carne, pobre comprar carro, pobre viajar de avião, pobre fazer sua pequena agricultura, ser microempreendedor, ter sua casa própria. Se esse é o crime que eu cometi eu quero dizer que vou continuar sendo criminoso nesse país porque vou fazer muito mais. Vou fazer muito mais.” – LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. Leia a íntegra do Discurso de 7 de Abril de 2018.

SIGA VIAGEM:

 

BIBLIOGRAFIA
“LUIZ INÁCIO LUTA DA SILVA”, Ed. Contracorrente. São Paulo, 2018.

Por que os brasileiros elegeram um aspirante a ditador? – Por André Pagliarini em The New Republic

Ilustração por Alex Nabaum

Por que os brasileiros elegeram um aspirante a ditador?

Jair Bolsonaro venceu a presidência com a promessa de restabelecer o regime militar

Por André Pagliarini em The New Republic (13 de novembro de 2018)
Tradução: Raquel de Vasconcellos Cantarelli

Jair Bolsonaro não aprecia muito a democracia. O presidente recém-eleito menospreza a noção de direitos humanos como um “desserviço” ao Brasil. Ele lamenta o fato de que a polícia, uma das mais letais do mundo, não tenha o direito de matar com mais liberdade, prometendo-lhe carta branca em sua administração. Certa vez, propôs utilizar um helicóptero para jogar panfletos advertindo os traficantes a abandonarem as comunidades pobres, ou seriam indiscriminadamente baleados.

Bolsonaro é de longe a mais proeminente autoridade eleita a elogiar a rígida ditadura militar que governou o país de 1964 a 1985. Capitão reformado que serviu ao Exército de 1977 a 1988, foi um soldado sem notoriedade, cujas ambições políticas descomunais frequentemente exasperavam oficiais superiores. Em 1986, por exemplo, queixou-se à imprensa da falta de aumentos salariais e da escassez de perspectivas profissionais aos soldados da ativa.

Pouco depois, foi julgado pela Justiça Militar por incitação à desordem. (Foi acusado de conspirar para atirar bombas em um quartel militar e foi condenado, mas ganhou na apelação e as acusações contra ele acabaram sendo retiradas). Na época, fazia pouco tempo que os militares tinham restituído o governo ao controle civil. Mas Bolsonaro, ao contrário de muitos oficiais superiores, nunca aceitou a redução das funções militares na vida brasileira.

Em sua campanha presidencial, escolheu um general como vice-presidente e prometeu nomear outros militares para cargos-chave do governo. Ele pretende militarizar as fronteiras do Brasil e descreveu o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – uma organização que ocupa grandes propriedades improdutivas no campo para advogar pela reforma agrária e denunciar desigualdades rurais – como uma organização terrorista. Resumindo, promete reviver em espírito, se não necessariamente por lei, a força repressiva do regime militar.

O alinhamento de Bolsonaro com os militares segue uma clara lógica política. As Forças Armadas são as instituições públicas mais confiáveis do Brasil, tendo uma aceitação muito maior que o Congresso, considerado irremediavelmente corrupto pelos brasileiros, ou que o Judiciário, visto como um conluio isolado e mais interessado em resguardar seus próprios privilégios do que administrar justiça. (Juízes brasileiros estão entre os mais bem pagos do mundo).

Nos últimos anos, outros líderes da América Latina se beneficiaram de uma onda da direita. Maurício Macri, um conservador multimilionário, tornou-se o presidente da Argentina em 2015 e, em 2017, chilenos elegeram Sebastian Piñera, que trouxe para seu gabinete autoridades ligadas ao brutal regime de Augusto Pinochet. Contudo, Bolsonaro é um caso à parte por realizar algo que nenhum político havia tentado desde a restauração da democracia na região, há quase 30 anos: ganhou uma eleição nacional como ousado defensor da ditadura militar.

Bolsonaro serviu ao Exército numa época em que autoridades mais moderadas negociavam o retorno ao governo civil. Ainda havia, contudo, militares da linha-dura que acreditavam que restituir o poder à mesma classe política corrupta que havia sido, em grande parte, extirpada em 1964 seria um erro. Em outras palavras, desejavam continuar perseguindo os membros da esquerda. É quase certo que Bolsonaro pertencia a esse grupo.

Por três décadas no Congresso, lamentou-se frequentemente de que o regime não tivesse causado mais mortes, argumentando que matar 30.000 inimigos políticos na ditadura teria sido melhor do que as muitas centenas que de fato morreram. (“A ditadura errou ao torturar e não matar”, é uma expressão comum). Faz sentido que tal retórica militarista tenha favorecido Bolsonaro junto às Forças Armadas, mas não está claro por que convenceu o resto do Brasil. Apenas uma diminuta minoria clama por uma intervenção militar como a que culminou na ditadura de 1964. O que explica sua vitória?

Uma resposta simples seria a recessão. O Brasil está atolado em profundas dificuldades econômicas desde 2014. Para os brasileiros mais pobres, Bolsonaro prometeu mais empregos e a manutenção de benefícios do governo; para a classe média, o retorno ao status perdido enquanto o Partido dos Trabalhadores, de esquerda, esteve no poder; para os brasileiros mais ricos e investidores, a abertura do mercado, leis trabalhistas menos rigorosas e impostos mais baixos. É uma agenda atraente para aqueles que acreditam que a economia será restabelecida apenas se o governo ficar fora do caminho.

Bolsonaro também prometeu erradicar o crime, algo que até mesmo seus mais fervorosos oponentes consideram bem-vindo. Entretanto, poucos eleitores teriam levado a sério seus recursos violentos ou o considerado um candidato legítimo, não fosse a reabilitação gradual da ditadura na consciência pública. São 33 anos desde o fim do regime militar no Brasil. E enquanto memórias dolorosas daquele período recuam no tempo, a severidade do regime foi sendo suavizada. Isso com o auxílio de nova onda de políticos, economistas, movimentos, especialistas e intelectuais que visam contra-atacar o que entendem ser o controle total da esquerda sobre a política brasileira durante a última década e meia.

Resta-nos saber se o apelo nacionalista e militarista de Bolsonaro sobreviverá caso a economia brasileira demore a se recuperar. Entretanto, pode ser que isso não importe, pressupondo que Bolsonaro seja bem-sucedido em seu objetivo de fortalecer os poderes repressivos do Estado. O povo brasileiro tem voluntariado seu apoio a ele, mas pode não ter permissão para retirá-lo.

LULA VALE A LUTA – Editorial A Casa de Vidro

Editorial A Casa de Vidro 

Compreender o ódio que Lula desperta só é possível compreendendo o Amor que ele suscita

Aqueles que o odeiam talvez sintam uma inveja, que não confessam, que recalcam, diante do grau de veneração de que Lula é alvo.

Raros são os seres humanos que um dia chegam, nesta existência finita em que somos todos tão breves mortais, do grau de amor de que Lula tem sido receptáculo e objeto. E ele expressa nestas relações amorosas com os outros uma capacidade de empatia extraordinária, que nos levam a crer num mestre griô que detêm a maestria do Ubuntu. Lula lembra aquele iluminado que entendeu com perfeição e pratica, junto a seus apoiadores, o “Namastê”. Vi fotos recentes de muitos amigos e parentes meus com Lula, e nelas se expressa, na atitude do ex-presidente, todo o esplendor da gratidão, da generosidade de Luiz Inácio. Florescem, em meio à crise, suas amplas virtudes não só como líder político, mas como ser humano.

Tal como Pepe Mujica e Nelson Mandela, Lula é um Chefe de Estado raro: pois é sábio. Sua práxis revela a ética-em-ação de um sábio, de um portador da sophia, mas sobretudo de um ser humano de magnitude histórica.

A evidência de que Lula é de estatura histórica também suscita o ódio dos ignorantes, a fúria irracional de seus detratores: notem que quase todo mundo que taca pedras em Lula são pessoas que estão esmagadas pela sensação de anomia, de desvalor, conexa à percepção (muitas vezes recalcada) de sua própria nulidade social. Os que nada fazem em prol de uma sociedade melhor, mais justa, mais amorável, são os que mais rangem os dentes e tacam as flechas de ira contra o ex-presidente, injustiçado por uma fraude jurídica.

Penso nos ensinamentos de Zygmunt Bauman, no raio-X que este faz dos males da sociedade contemporânea, e creio que a perseguição, a condenação, a difamação, os discursos e as práticas de ódio contra o Lula provêm daqueles que são líquidos, ou sejam, efêmeros, em contraste com Lula, que apesar da sua presença em carne-e-osso ser limitada e seu prazo entre os vivos está se esgotando, já pôs um pé não só na cova, mas na História, na lembrança dos que virão…

Suspeito que muitos dos que mais odeiam Lula são aqueles que não entrarão para nenhuma História com H maiúsculo, isto é, são aqueles que, como a maioria de nós, morrendo, serão esquecidos. Pois a maneira mais fácil de morrer e ser esquecido é nada fazer pelo bem do espaço público – Arendt ensina.

Morrer e ser esquecido é destino possível para qualquer um de nós, mas o privilégio de permanecer como imorredouro na memória das gerações seguintes é para poucos, para raros. Lula é um desses raros, um ser humano que sai da vida para entrar na História, permanecendo vivo e ativo nos corações e mentes daqueles que o amam e que vão sobreviver a ele. Somos os que levam adiante a primavera após a poda de milhares de flores na Árvore dos Direitos Sociais. E Lula será semente. Assim como Marielle. São mortes que frutificarão pois foram vidas que trabalharam em prol de todos nós.

O ódio contra Lula também é porque Lula, morrendo, jamais será esquecido. Ele não estará apenas como um nome em livros de História que pegam poeira, ele estará entre nós de modo similar à presença de Martí, Fidel e Che na memória coletiva dos cubanos, ou de Salvador Allende na memória coletiva dos chilenos.

Acredito que a epidemia de ódio contra Lula é diretamente proporcionalmente à onda de amor que lhe é concomitante. Qual das duas marés vencerá? É uma pergunta que deixaria o filósofo pré-socrático Empédocles bastante perplexo. Pois ele achava que o Cosmos por inteiro era uma entidade tão dinâmica, tão fluida, tão metamorfoseante, justamente devido à dança infinda do Amor e do Ódio. O Teatro do Mundo é o mega-palco onde interagem sem fim o ímpeto de reunião e de amorosidade, em conflito com o ímpeto de Ruptura e de odiosidade.

A ascensão do ódio, este afeto fascista, só poderia ser vencida por uma maré de amor que fosse mais forte e poderosa? Talvez: mas o amor não se comanda de palácios, nem o ódio é capaz de ser controlado deles. Os amores e os ódios das massas não se controlam de cúpulas, ainda que tentem determiná-los de cima de púlpitos e de meios de comunicação em massa…

Por isso, o momento histórico é de apreensão: rondam os fantasmas assustadores da guerra civil, da intervenção militar, da repressão policial violenta, de outros horrores que se acercam, como a prisão em massa de militantes petistas (uma probabilidade já palpável…).

O que tentei expressar, nestas mal traçadas linhas, talvez inúteis mas que tive que arrancar do peito, é que o ódio anti-lulista é um inimigo complexo e duradouro. O ódio fascista expressa ressentimentos diante de Lula porque ele é um ser humano que experimenta um grau de “adoração”, por parte das massas, que a maioria dos vociferantes anti-lulistas nunca vão vivenciar.

Lula transformou São Bernardo do Campo numa espécie de epicentro da crise política brasileira em 06 e 07 de Abril de 2018, dias lendários onde congregou-se a Resistência Democrática. O “cordão humano” a proteger Lula se fez justamente no cenário de sua ascensão como líder sindicalista no fim dos anos 1970 e começo dos anos 1980, nas históricas jornadas grevistas tão bem documentadas pelos geniais cineastas Leon Hirszman (ABC da Greve, Eles Não Usam Black-Tie) e Renato Tapajós (Linha de Montagem). Foi a épica batalha do bunker do ABC contra a Ditadura Togada de Curitiba!

O momento histórico chama o MST, o MTST, a UNE, a UBES, a CUT, o Levante, o PSOL, o PC do B, uma miríade de outros movimentos e frentes (como Povo sem Medo e Frente Brasil Popular), a se alçarem à altura da tarefa histórica que lhes compete na defesa de Lula. E ele, por sua vez, vai ter que surfar com as massas que lhe apoiarão, coligado com as forças de resistência, improvisando as ações de sua Desobediência Civil ao regime ilegal e ilegítimo que hoje nos desgoverna.

Pois eu duvido muito que Lula simplesmente vá caminhar com resignação de ovelha para o matadouro dos golpistas.

Martin Luther King, assassinado há 50 anos atrás, ensinou – assim como Gandhi, Mandela, Thoreau, Sophie Scholl, e tantos outros – que às vezes estar do lado da Justiça exige que a gente pratique a Desobediência Civil. Lula deve saber com total lucidez que às vezes é justo a prática da desobediência a um Poder Judiciário corrompido, fascistóide, que pratica uma Justiça caolha e de facção. Lula não é besta de acatar em silêncio a jaula urdida pelo lawfare fascista de nossa Elite do Atraso. Por isso acho plausível vem aí uma maré alta de Desobediência Civil no campo do lulismo. Um fenômeno cuja feição histórica poderá depois ser comparada àquelas famosas aventuras desobedientes e subversivas de Gandhi ou Thoreau – resta saber quão bem Lula saberá “governar”, ainda que gradeado, as massas mobilizadas nas ruas e nas redes.

O cenário é explosivo e violento… Não sabemos se o organismo físico que sustenta Lula terá condições de sobreviver a este processo, estressante ao extremo. Parece que o fascismo entre nós está tão assanhado, a crueldade de alguns se manifesta de maneira tão despudorada, que se Lula morresse, haveriam hordas que sairiam às ruas para comemorar.

O que estão fazendo com Lula as forças golpistas, instauradoras do atual Estado de Exceção, é uma espécie de tentativa de homicídio a contagotas. Lula está ainda no luto de sua esposa Marisa, ainda impactado pelos tiros que atentaram contra sua caravana no Paraná, ainda sob as fortes impressões da perseguição jurídica e policial que culminou em sua condenação e prisão (sem provas, mas com muitas convicções). Lula, sobrevivente do câncer e da ditadura, deve estar sofrendo com um grau de pressão que poderia fazer explodir os nervos de um ser humano mais fraco. Mas este, desde suas origens pernambucanas até chegar ao status de Estadista conhecido em todo a face da Terra, sempre viveu como um guerreiro.

Nasceu, viveu e vai morrer como guerreiro.

Nestes dias, como se tivesse sido capturado pela teia de aranha de um romance de Franz Kafka, o ex-presidente sente na pele o que é ser um dos milhões de Josefs K de que nossa história e nosso presente estão repletos. Mais sábio que outrora, o Lula de 2018 deve estar voltando a sentir na pele a situação explicitada naquela fotografia antológica dele sendo fichado pelo DOPS na Ditadura em 1968. No xadrez do mundo, em cheque, o maior líder de massas do Brasil no século 21 pode até parecer acuado, mas creio que ele vive dias de uma intensidade que só vivenciaram figuras como Lênin, Che, Fidel, Chavez, no auge de crises políticas extremadas… Lula, como eles, sabe que às vezes desobedecer não só é justo: é necessário para a transformação radical de um mundo de injustiças instituídas.

O ódio nasce nos corações que sofrem de inanição e desamor, elementos que ficam cozinhado na lenha da ignorância, da alienação, do preconceito, e são engatilhadas pela mídia de massas, que adora ter os odientos, os odiadores, como seus Manifestoches (como nos iluminou a Tuiuti!).

Decerto que o amor também pode ser cego, mas o amor é capaz de ser também vidente, e altamente terapêutico, e curador das fraturas; já o ódio é sempre cego, e encegante.

Nesta encruzilhada histórica, prefiro enormemente estar entre os que amam Lula, e não entre esta gentinha medíocre, ressentida, fracassada, que o ofende, que o xinga, que o trata com aquela fúria fascista do “Homem De Bem” que está fustigando o “Homem de Mal”. Cabe lembrar: a Ku Klux Klan, entidade racista do supremacismo Yankee, publicava o jornal “The Good Citizen”, o Cidadão de Bem…

O destino de Lula explicita o quanto o Brasil está fraturado por conflitos irreconciliáveis. Situação que o termo “polarização” não transmite a contento, pois os pólos de um termômetro coexistem e colaboram, enquanto os nossos pólos estão prestes a entrar na guerra civil, ou seja, naquilo que explode o termômetro.

O que torna algumas destas cenas de Abril de 2018 exemplares de uma espécie de Messianismo Político, algum fenômeno teológico-político de tal complexidade que exigiria as capacidades reflexivas de um Spinoza, de um Freud, de um Canetti… Para muita gente, Lula é quase um Messias. Uma figura meio Antonio Conselheiro… Alguém com um halo semelhante ao do Papa Francisco… Reacende um fogo primordial que estava no PT original, a Teologia da Libertação, as comunas eclesiais de base… A missa ecumênica em memória de Marisa apontou nesta direção, como se as forças sociais tivessem investindo o episódio de um certo halo de simbolismo inclusive religioso…

Já circulam boatos de que os atos que estão ocorrendo parecem “cultos” – e são. Lula tende agora a tornar-se mártir desse culto, e a morte de Lula selará uma etapa de um processo que não acabará nem em décadas, nem em séculos. Ninguém é capaz de parar o Lula morto. Ninguém é capaz de parar o Lula preso. Ninguém é capaz de parar o Lula, nem a morte. Ela vencerá, mas ele dará o troco. Em nós viverá, suas pernas andarão por nossas pernas, suas narinas respirarão por nossos pulmões, seu cérebro pensará por nossas cabeças, seus sonhos de justiça e fraternidade queimarão em nossos corações, e os poderes instituídos hão de tremer diante da primavera no deserto.

A grande incógnita, ainda, é: que morte será esta? A morte de Lula será a morte de qual semente? O que dela nascerá? Quer esta morte seja iminente, quer ela demore ainda anos e anos para vir, ela não apagará jamais este destino. Esta existência singular estará nas memórias até mesmo daqueles que ainda não nasceram.

Os odientos, os furiosos, os que tacam pedras, os que xingam o condenado, os que desejam que Lula sofra horrores e seja torturado, estes replicadores dos ódios do Gólgota e das torturas da paixão de Jesus, vão seguir ladrando como lobos irracionais, sim, é algo esperável e preocupante: o fascismo brasileiro, de tão disseminado que está no atual cenário pós-democrático, não vai se calar tão cedo.

E só os cegos voluntários não enxergam que o alvo principal do fascismo made in Brazil é atualmente o campo do petismo. Isso se explicitou. E gerou uma situação onde será difícil, quase impossível, escaparmos de uma exacerbação dos conflitos e dos enfrentamentos. Cenário, infelizmente, mais propício para um novo Golpe de Estado do que da deflagração de um processo autenticamente revolucionário.

Tenhamos cuidado, mas sejamos resolutos em estarmos do lado da sabedoria, do amor e da justiça enquanto acompanhamos o desenrolar da prisão histórica de Lula, esta lenda viva, um dia destinada à História, mas hoje em pleno esplendor furioso de decisões e eventos que vão dar forma não só a seu destino singular, mas a de todo nosso país.

Por fim, sugiro um play no vídeo a seguir, da Mídia Ninja, e uma resposta à uma simplória enquete proposta, lá do fundo do túmulo, por Empédocles e Spinoza:

LULA: Você prefere
(1) amá-lo
ou
(2) odiá-lo?

Se preferes amá-lo, estamos juntos.

* * * * *

Eduardo Carli de Moraes
www.acasadevidro.com

 

 

ELEIÇÃO SEM LULA É FRAUDE! – A Ditadura da Toga e a nova fase do Golpe de Estado no Brasil

ELEIÇÃO SEM LULA É FRAUDE!

O Brasil insiste em dar razão a Millôr Fernandes: somos um país com um longo passado pela frente. A coalização golpista, que lançou 54 milhões de votos no lixo através do golpeachment de 2016, tornou-se responsável por uma avalanche de medidas elitistas e antipopulares, da reforma trabalhista neo-escravocrata à aprovação da medida constitucional do congelamento de gastos. O colonialismo de outrora se recicla no entreguismo de agora: e dá-lhe pré-sal entregue pros gringos a preço de banana! Dá-lhe subserviência neo-colonial à Shell (From Hell) e à Belo Sun – empresas que hoje riem às gargalhadas com a disposição favorável ao capital imperial anglo-saxão que vem demonstrando o governo nascido do golpe.

Enquanto lançam o país de volta ao Mapa da Fome, do qual havíamos saído por mérito dos programas sociais desenvolvidos nos cerca de 5.000 Dias de Lulismo (confiram o livro da Ed. Boitempo), os sanguessugas que hoje ocupam o poder, sem aval do voto, prometem 20 anos de cruel austericídio, com serviços públicos entregues às moscas da negligência, com o orçamento para educação e saúde cortado pelas tesouras de economistas neoliberais afinados à Doutrina do Choque.

Títere dos interesses escusos do capitalismo selvagem, o traíra Temer vai se arrastando rumo ao fim de seu desgoverno como um dos presidentes mais impopulares da história de nossa república. A ruptura das regras democráticas é tamanha que o perigoso espectro que nos ronda é o do fascismo Bolsonazista – hoje em segundo lugar nas intenções de voto para as eleições de 2018. Ainda que beire o inacreditável que possam existir tantos milhões de brasileiros que estejam tão severamente alienados, embrutecidos e estupidificados a ponto de manifestarem apoio a um sujeito desses, que sempre que faz uso da fala leva-nos a lembrar de outra fase de Millôr: “a boca é o aparelho excretor do cérebro”.

Enquanto Bolsonaro caga pela boca seus racismos, suas misoginias, suas homofobias, seus militarismos, o aspirador-de-pó tucano Aécio Neves prossegue impune de todos os seus crimes, ainda gozando de seus privilégios como Senador da República, ainda sorrindo por dentro por ter sido derrotado nas urnas em 2014 mas ter conseguido se vingar dos vitoriosos no tapetão de Eduardo Cunha… Para dar conta de tal contexto, só mesmo recuperando os versos do poeta Cazuza, que mostra a cara do Brasil como “piscina cheia de ratos” onde  “ideias não correspondem aos fatos”.

Enquanto a miséria e o desemprego avançam, enquanto batemos recordes nos índices de homicídio, enquanto seguimos líderes globais no uso de agrotóxicos, enquanto a bancada Bíblia-Boi-Bala segue reinando, enquanto banqueiros seguem lucrando horrores com os juros da dívida pública que o Estado brasileiro gentilmente segue lhes transferindo, enquanto toda essa tempestade de bosta despenca sobre nossas cabeças, ainda há quem sustente que todos os problemas do Brasil estarão resolvidos decapitando o Lula e destruindo o PT…

Aquilo que Jessé Souza chama de “A Elite do Atraso” empunha hoje a bandeira do “nenhum retrocesso a menos!”, como argumenta Luis Felipe Miguel. A condenação de Lula – sem provas, mas com muita convicção! – dá continuação ao Golpe de Estado que derrubou Dilma com o pretexto espúrio das pedaladas fiscais. Assim como não havia base legal alguma, nem sombra de crime de responsabilidade que justificasse a medida extrema do impeachment contra Dilma, o esforço de condenação de Lula dá prosseguindo à Ditadura da Toga e do P.I.G. que já havia se manifestado quando o ex-presidente foi impedido de tomar posse como Ministro da Casa Civil.

Depois de vasculharem a vida inteira do ex-presidente, com grampos e vazamentos ilegais, os togados mobilizaram todo seu arsenal de Powerpoints toscos e falácias lógicas da Lawfare Moronística para decapitar o ex-presidente. O recente livro do filósofo Euclides Mance revela As Falácias de Moro, o super-herói dos tolos:

Mas Lula é uma hidra.

O vandalismo midiático, o assassinato de reputações praticado pelo Partido da Imprensa Golpista, as fake news publicadas pela Globo, as capas caluniosas da revista Veja, tudo isso vai lançando gasolina na fogueira do anti-petismo e do anti-lulismo, estas forças irracionais e autoritárias que fazem do Coxinato esta insuportável parede de bocas que ficam papagueando: “Luladrão!”, “mensaleiro!”, “bando de vagabundos comedores de mortadela!”, “maior bandido na história da corrupção política mundial!”, dentre outras babaquices propagadas pelos que tem interesse na desinformação, na alienação, na caça às bruxas e nos justiciamentos de bodes expiatórios como panacéia para os males nacionais…

Lula, porém, tem uma força impressionante junto às massas, não só por ter finalizado seus 8 anos de governo com o mais alto índice de aprovação popular de toda a história da república, mas porque ainda encarna a esperança e a promessa de um governo que combata privilégios em prol de mais justiça social. Lula é o tipo de figura histórica de tal magnitude que desespera aqueles que, como na tirinha de Henfil, desejam decretar que o povo é ilegal. Pois o povo está com Lula, e não por ter sido iludido por demagogia populista, como podem argumentar seus detratores, mas pois este mesmo povo pôde experimentar na prática os vários avanços, ainda que insuficientes, dos governos petistas. Ainda que tenham sido de conciliação de classes, ainda que presos a um neo-desenvolvimentismo questionável em muitos aspectos, os governos petistas arregaçaram as mangas para começar a combater as horrendas injustiças sociais herdadas de nosso passado colonial-escravagista.

A Ditadura da Toga pode até lançar sobre Lula a condenação em Porto Alegre, como que tentando abater logo em Janeiro a candidatura predileta da imensa maioria do povo brasileiro. Mas Lula, que viveu como guerreiro e vai morrer como guerreiro, não conhece o conceito de “desistência”. Terá junto a si uma ampla gama de movimentos sociais mobilizados – MST, MTST, UNE, CUT, NINJA etc. Irá em frente com a candidatura – e vamos ver o que a coalização golpista fará para impedir sua posse, caso ele abocanhe os cerca de 60 milhões de votos que provavelmente terá.

Lula vai lutar até o fim por seu direito a candidatar-se à presidência – e obviamente o combate será acirrado, pois as elites golpistas cagam de medo de uma 5ª derrota consecutiva nas urnas e preferem tirar Lula do páreo, ainda que para isso seja preciso lançar na lama a reputação do ex-presidente com um processo tão pífio quanto este do triplex do Guarujá. A delação premiada de um empresário criminoso da construtora OAS, que tem todo o interesse de mentir para se safar, dizendo o que a elite e seus apoiadores querem ouvir, está sendo utilizada de modo imoral por essa gentalha de toga que age com base em “não temos provas mas temos convicções!” e que argumenta com tais falácias lógicas como “se O Globo acusou só pode ser verdade!”

Como escreveu Luis Felipe Miguel, “tirando Lula do páreo, a coalizão golpista mostra que está disposta a abandonar qualquer fachada de democracia e não se dispõe a negociar nada, nada mesmo, com a maioria do povo brasileiro. Sua bandeira parece ser: nenhum retrocesso a menos. Para protegê-la, está pronta a sacrificar qualquer pretensão à legitimação popular de seu mando. (…) Por isso, a defesa intransigente do direito do ex-presidente a se candidatar é muito maior do que o Partido dos Trabalhadores e o lulismo. É uma linha divisória entre democracia e golpismo.”

A Casa de Vidro, visando contribuir com o debate político qualificado, descrente de qualquer possível neutralidade nas polêmicas sociais, manifesta-se em defesa do direito de Lula de ter um julgamento imparcial e justo – o que está longe de ser o caso no atual processo. Selecionamos abaixo algumas daquelas que julgamos serem as melhores publicações na imprensa sobre o tema e que só consolidam a vontade de protestar junto ao coro, em Porto Alegre, no iminente Fórum Social Mundial de Salvador e nas centenas de comícios e manifestações que virão: ELEIÇÃO SEM LULA É FRAUDE!!!

SIGA VIAGEM:















FERMENTO PRA MASSA – Goiânia na Greve Geral (Documentário, Curta-Metragem, 2017, 21 min)

FERMENTO PRA MASSA – A GREVE GERAL EM GOIÂNIA
Um documentário curta-metragem de Eduardo Carli de Moraes
Uma produção independente A Casa de Vidro

“Hoje eu vou comer pão murcho, o padeiro não foi trabalhar / A cidade tá toda travada, é greve de busão, tô de papo pro ar!” É o que canta Criolo em “Fermento Pra Massa”, canção do álbum “Convoque Seu Buda”, convocada para inaugurar e batizar este doc em clima de samba-resistente. “Eu que odeio tumulto não acho insulto manifestação / Pra chegar um pão quentinho com todo o respeito a todo cidadão!”

Era um dia histórico na Nova República: a maior Greve Geral desta geração, com adesão de cerca de 35 milhões de pessoas em todo o país, coincidia com os 100 anos da pioneira, inaugural Greve Geral de 1917.

Em 1917, quando mulheres e crianças labutavam até 16 horas diárias, irrompeu em São Paulo a primeira grande luta operária brasileira, dirigida por anarquistas. Como começou. Quais suas conquistas e atualidade – Por Eduardo Alves Siqueira em Outras Palavras

A multidão em Goiânia, estimada pelos jornais Daqui em cerca de 30 mil pessoas – número inflado pela CUT a exagerados 70 mil manifestantes – era polifônica, multifacetada, pulsante como um mega-organismo da reXistência, parte de um todo-humano enigmático – “nós somos os 95%”! – que esparrama-se como um Octopus de mil tentáculos pelo território nacional.

Goiânia

São Paulo

Recife

Rio de Janeiro

Na Goiânia das dez vanguardas, nesta data, decerto houve caos e cacofonia. O tecido da sociedade está mesmo todo esgarçado, polvilhante de antagonismos. Em uma das vanguardas, onde as bandeiras negras dos movimentos anarquistas e antifascistas misturavam-se a cartazes coloridos propugnando “AMAR SEM TEMER”, ouviam-se em altos brados palavras-de-ordem como: “É barricada, greve geral, ação direta que derruba o capital!”

Re-aquecendo as brasas da Primavera Secundarista que fez História em 2016, com mais de 1.000 ocupações, a estudantada botou de novo a boca no trombone e cantou em alto e bom som todos os punk-hits da temporada. O hit do ano passado voltou a dar as caras neste dia de strike: “acabou a paz, mexeu com estudante, mexeu com Satanás! Olha o capeta!” Já o brado desafiador também não faltou: “o Estado veio quente, nóis já tá fervendo! Quer precarizar? Não tô entendendo! Mexeu com estudante, você vai sair perdendo!” Os batuques comiam soltos enquanto os coros de brados ressoavam pelo centro, informando a todos que “em Goiás tem escola de luta! Fica preparado: precariza nóis ocupa!”

Na frente da Assembléia Legislativa, a multidão concentrou-se pela manhã do dia nacional de paralisação e alguns traziam caixões de isopor – ecos do protesto do Acampamento Terra Livre diante do Congresso Nacional. Nos caixões se lia: “Morreram Antes de Se Aposentar”. Os nomes ali inscritos eram tantos que aquilo que parecia ser um caixão tamanho individual mostrou-se logo como símbolo de uma vala comum. A vala comum que o desgoverno em curso pretende impor com suas deformantes Reformas.

O “Fora Temer” parecia ser um consenso ruidosamente reafirmado em dúzias de ruas e esquinas, mas os Fora Iris e Fora Marconi também não ficaram atrás. Explosões de indignação diante da truculência da PM goiana também não tardariam, quando o sangue do estudante da UFG, Mateus Ferreira, seria derramado pelo brutal cassetete de um capitão da PM.

Em estado grave, na UTI, com traumatismo craniano, respirando por aparelhos, o estudante com o crânio esmagado serve como emblema do autoritarismo irracional daqueles que se fazem cães-de-guardas de um regime golpista que cada vez demonstra mais que seu único argumento contra a dissidência é a barbárie da porrada.

Esgoelando-se sobre o carro de som, Davi Maciel, professor de História da UFG, esbravejou:

“A Reforma da Previdência e a Reforma Trabalhista não visam apenas bater a mão na nossa carteira, não é apenas um estelionato pra tirar direitos, pra nos fazer trabalhar mais tempo e nos fazer trabalhar mais barato, mas visa sobretudo baratear nosso salário.” Evocando os 150 anos em que já estamos convivendo com o espectro de Karl Marx e das análises de seu “O Capital”, o professor conclamou ainda: “Temos que derrotar esse Governo estelionatário, esse Congresso estelionatário, que bate a mão na nossa carteira, que nos dá um golpe barato… Fora com essa pauta de reformas anti-populares, favoráveis ao capital! Greve geral enquanto essas reformas não forem vetadas! Fora Temer!”

Houve quem desfilasse pelas ruas seu catolicismo, re-aproximado da Teologia da Libertação pelas idéias e práticas de Jorge Bergoglio (o Papa Francisco). Este era celebrado no cartaz de uma manifestação por sua frase de utopista: “Nenhuma família sem casa, nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem direitos.”

Em escudos, faixas e camisetas também prestava-se solidariedade a Rafael Braga. Quando a senhora pergunta “quem?”, a moça explica: “É o cara que foi preso numa manifestação por porte de Pinho Sol…”. De cima do carro de som, estudantes gritarão: “Eu falo por Amarildo, falo por Rafael Braga!”

Os estandartes vermelhos arrastados pela avenida eram também de várias faces: do MTST – Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto ao SINTEGO, o escalarte era uma das cores mais vistas no dia da Greve Geral, também pela profusão de camisetas da CUT Brasil.

Infelizmente, outro vermelho marcaria este dia: o sangue derramado pela truculência brutal da Polícial Militar. O estudante da UFG, Mateus Ferreira, que curta Ciências Sociais / Políticas Públicas”, sofreu uma violenta agressão por parte de um capitão da PM; a história deste crânio esmagado e da banalidade do mal está neste outro texto:

O sangue derramado sobre o asfalto pode até ter sido lavado, junto com o resto dos refugos da Greve Geral, mas ele não será esquecido tão cedo.

Ao escarlate do sangue misturavam-se as lágrimas indignadas que eu via correrem de muitas faces enquanto Mateus era atendido pelo Corpo de Bombeiros, estirado na Avenida Goiás, enquanto a galera gritava a plenos pulmões para a PM: “Polícia, fascista, você que é terrorista!”.

Passei as últimas horas obcecado com o pensamento de que aquele crânio esmagado poderia ter sido o meu. Ou o de algum amigo querido. Ou o de alguma companheira de midiativismo. A brutal agressão policial, furiosa irrupção de um autoritarismo brucutu, explicitação da completa incapacidade de reflexão e auto-controle por parte do criminoso fardado, poderia ter atingido qualquer um de nós.

Este texto poderia nunca ter sido escrito pois seu autor poderia estar agora numa UTI, com o crânio esmagado, pelo fato de estar nas ruas com uma câmera… O sangue entre as sobrancelhas da Júlia Aguiar, agredida por um policial enquanto tirava fotografias, não me deixa mentir.

Ao meio-dia deste 28 de Abril, enquanto o helicóptero da polícia sobrevoava baixo sobre nossas cabeças, ostentando o barulho de suas hélices e a metralhadora de seus soldados, eu filmava aquilo com as mãos tremendo: Mateus, desmaiado, a cabeça ensanguentada, carregado pelos companheiros desde a Anhanguera, através da Avenida Goiás, enquanto a Tropa de Choque e a Cavalaria já realizavam suas manobras para “dispersar” a multidão, usando aqueles métodos aprendidos com aquela Ditadura que alguns conjugam no passado, como se fosse matéria de livros de História, mas que ainda estamos longe de ter superado. A PM não só esmagou o crânio de um estudante de Ciências Sociais/Políticas Públicas; deixou-o ali para sangrar em praça pública.

Tudo isso aconteceu sob o olhar impiedoso da estátua do Anhanguera, genocida de pedra que decora o epicentro de Goiânia como um lembrete das autoridades ao povo: aqui tratamos como heróis e batizamos com nomes de avenidas aqueles que, no passado, marcaram época pelo sangue que derramaram em seus propósitos colonizadores. Se aquela estátua pudesse aplaudir, os PMs teriam tido as únicas palmas do dia. Agora, na cibercultura de nosso mundo cada vez mais insanizado e mais próximo de Black Mirror, fãs de Bolsonaro e fascistas de Facebook fornecem os aplausos ao horror…

Quem tenta justificar uma agressão homicida, que deixou o estudante da UFG com traumatismo craniano e respirando por aparelhos, já pôs-de do lado dos carrascos, já filiou-se como cúmplice do fascismo, já é funcionário inconsciente da banalidade do mal. “Se ele tivesse ficado em casa, isso não teria acontecido”; “Ele provavelmente quebrou umas vidraças de banco, caso contrário não teria apanhado da polícia”; “Ele teve sua cabeça destroçada por um cassetete da PM, é verdade; mas quem mandou cobrir o rosto com uma máscara?” Nem é preciso ter estudado a “Psicologia de Massas do Fascismo” de Wilhelm Reich pra perceber nestes argumentos a manifestação do fascismo cotidianizado, que enxerga vidraças como mais sagradas do que vidas humanas, que aplaude a crueldade fardada como se esta fosse panacéia pra pôr ordem em nosso caos… – LEIA MAIS

Sobre o episódio da lamentável brutalidade do policial contra o manifestante, a Faculdade de Ciências Sociais da UFG publicou a seguinte nota de solidariedade:

https://www.facebook.com/blogacasadevidro/posts/1901067016586281

A TV Anhanguera, filiada da Rede Globo, também realizou uma reportagem e entrevista com a mãe e o pai do Mateus:

Estes e outros agitos deste dia histórico no Brasil estão nos 20 e poucos minutos do filme. “Fermento Pra Massa” contou com a colaboração de Renato Costa, nas filmagens, e inclui fotografias de Annie Marques,Júlia Aguiar, Luiz da Luz e Jean Pierre Pierote. A trilha sonora inclui, além de Criolo, “Take The Power Back”, do Rage Against The Machine, “La Bala”, de Anita Tijoux, e “O Dia Em Que A Terra Parou”, de Raul Seixas. Acesse o post e saiba mais em A Casa de Vidro: www.acasadevidro.com.

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É GREVE GERAL! Pelo Brasil afora, o 28 de Abril de 2017 marca uma nova etapa de resistência e contestação à avalanche de retrocessos que veio na esteira do golpe parlamentar-jurídico-midiático de 2016

É GREVE GERAL!

Brasil afora nesta Sexta-feira, 28 de Abril de 2017: nenhum direito a menos, não ao golpe contra o trabalhador! #ForaTemer!

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ARTIGOS DE INTERESSE

Antonio Martins, Mídia Ninja: “Crescem os sinais de que a greve geral desta sexta-feira será um protesto vasto e múltiplo. A iniciativa foi do movimento sindical, mas a chama da revolta se alastrou. Ela é visível, por exemplo, nas ações do MTST – Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto – que convida para marcha até a casa de Michel Temer, em São Paulo; no apoio explícito oferecido ao movimento por parte da igreja católica; nos comunicados que os professores das escolas mais tradicionais enviam aos pais de seus alunos; nas convocações espontâneas que inundam as redes sociais; em uma multidão de gestos semelhantes.

Num certo sentido, a greve é contra o sistema político – porque a democracia transformou-se numa farsa. Em Brasília, um presidente ilegítimo e um Congresso suspeito continuam de costas para o povo. Todas as pesquisas mostram: a esmagadora maioria da população e contra as mudanças na aposentadoria e a terceirização do trabalho. Mas ambas as propostas podem ser aprovadas, por deputados e senadores suspeitos de receber propinas. E para aprová-las, o Palácio do Planalto recorre a um arsenal de métodos corruptos: liberação de dinheiro (R$ 800 milhões) para os deputados, na forma de emendas parlamentares; loteamento de empresas estatais; negociação aberta de cargos públicos.

Ou seja: o país é governado por uma casta política. Esta casta não presta satisfações à sociedade, mas ao poder econômico que financia suas campanhas. Enquanto esta situação persistir, os ataques aos direitos sociais e a entrega do país às grandes empresas não cessarão.

A greve geral é um grito contra esta democracia de fachada – mas depois dela faremos o quê? Alguns estão de olho nas eleições de 2018, que se aproximam e tendem a ganhar cada vez mais atenção. É uma resposta muito pobre. Em 2018, se nada for mudado, será eleito um Congresso muito parecido com o atual. Igualmente interessado em fazer favores ao poder econômico – e dele receber agrados. Igualmente desligado da sociedade e do debate dos grandes temas nacionais. Ainda que se eleja um presidente de esquerda, seu poder será, sob o sistema atual, extremamente reduzido – quase cosmético. Estará limitado pelo Congresso, pela mídia, pelo Judiciário. Terá de fazer concessões e barganhas. E estas barreiras, que já eram enormes antes do golpe, serão agigantadas após as contra-reformas radicais que o governo Temer está aprovando.

Na última semana, um conjunto de movimentos sociais que acredita nesta hipótese voltou a se articular, depois de três anos. Chama-se Plataforma pela Reforma Política. Realizou, em 2014, um plebiscito informal sobre o tema, do qual participaram 8 milhões de pessoas. Esteve desarticulado, devido às tempestades que marcaram a cena nacional. Voltou a se reunir num seminário em Brasília, do que participaram dezenas de ativistas, de todo o país. A retomada certamente tem a ver com os novos tempos que vivemos; com a necessidade de construir, para uma situação de exceção, respostas que não sejam banais, que não se limitem a depositar um voto em urna.

Durante três dias, os integrantes da Plataforma pela Reforma Política reviram e atualizaram o leque de propostas que construíram há quatro anos. Em breve, os resultados serão apresentados à sociedade. Debate-se a hipótese de construir um decálogo, que reúna as posições mais impactantes.

As propostas da Plataforma abrangem cinco aspectos: promoção da Democracia Direta; construção de instrumentos de Democracia Representativa; mudanças radicais no Sistema de Representação; democratização da mídia; democratização do Judiciário. Vamos apresentá-las, ponto por ponto. Começaremos pela Democracia Direta…”

SAIBA MAIS


INTERLÚDIO MUSICAL

CRIOLO – Fermento Pra Massa
Do álbum Convoque Seu Buda


NINA SIMONE – Revolution e Strange Fruit


INFORME-SE:

Lobistas de bancos, indústrias e transportes: quem está por trás das emendas da Reforma Trabalhista – The Intercept Brasil

Adesão à greve geral contra reformas cresce e fura a bolha “Fora Temer” – El País Brasil


O HOJE REFLETIDO NA HISTÓRIA

Em 1917, quando mulheres e crianças labutavam até 16 horas diárias, irrompeu em São Paulo a primeira grande luta operária brasileira, dirigida por anarquistas. Como começou. Quais suas conquistas e atualidade – Por Eduardo Alves Siqueira em Outras Palavras

Para o dia 28 de abril de 2017 está marcada uma greve geral em todo o Brasil. A “reforma” da previdência e o projeto de terceirização, propostos pelo governo de Michel Temer e apoiados pela maioria do Congresso Nacional, motivaram sua convocação por parte dos sindicatos, centrais sindicais e movimentos sociais. Ainda não se sabe a amplitude que terá a greve, mas sua necessidade é indiscutível. Há 100 anos, em julho de 1917, eclodiram greves capitaneadas por anarquistas na cidade de São Paulo, que culminaram em uma greve geral que paralisou a capital, espalhando-se depois pelos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

A chamada Greve Anarquista de 1917 foi considerada a primeira greve geral do Brasil. Ao longo de meados do século XIX, até a década de 1910, as primeiras greves se restringiam a categorias isoladas de operários da embrionária indústria brasileira. A partir da abolição da escravatura, em 1888, os pequenos e grandes empresários da época passaram a utilizar mão de obra estrangeira e assalariada para substituir os escravos. Os estrangeiros, na maioria italianos, portugueses e espanhóis, deixavam sua terra natal em busca de oportunidades, para fugir da pobreza e de eventuais perseguições. Traziam consigo as ideias que começaram a dominar o pensamento europeu a partir da Revolução Francesa de 1789, entre elas, as de liberalismo, socialismo, comunismo e anarquismo. Foi nesse contexto de intercâmbio cultural que floresceram, no seio da nascente classe trabalhadora brasileira, os conceitos de sindicato, direitos trabalhistas, luta de classes, livre-mercado, etc.

Nas décadas de 1900 e 1910, o sindicalismo mundial era disputado pelas vertentes socialista, comunista e anarquista. Desta última surgiu o termo “anarcossindicalismo”, que se caracterizava por uma atuação direta dos sindicalistas na organização dos trabalhadores, seja nas fazendas ou nas fábricas, sem um caráter institucional. Então, em 1917, com a difusão dessas ideias pelos imigrantes europeus, os princípios do anarcossindicalismo ganharam visibilidade e força no Brasil, justificando o título de Greve Anarquista. – CONTINUAR LENDO


FILMES RECOMENDADOS

A GREVE – de Eisenstein


NORMA RAE – de Martin Ritt




Clássico do cinema brasileiro, o documentário “ABC da Greve”, de Leon Hirzsman, retrata os acontecimentos na região do grande ABC paulista, em 1979, acompanhando a trajetória do movimento de 150 mil metalúrgicos em luta por melhores salários e condições de vida. Recomenda-se sessão dupla com outro filme do mesmo diretor, “Eles Não Usam Black-Tie”, baseado em peça de G. Guarnieri.

Veja também: Linha de Montagem, de Renato Tapajós (1981)

 

A FRATERNIDADE DOS REFUGIADOS – Sobre o filme “Era o Hotel Cambridge”, de Eliane Caffé

A FRATERNIDADE DOS REFUGIADOS
por Eduardo Carli de Moraes​

“Nós somos todos refugiados”, dispara Carmem Silva, uma ativista da Frente de Luta por Moradia (FLM) de São Paulo. “Somos refugiados da falta dos nossos direitos.”

Carmem, esta mulher da vida real que interpretou a si mesma em “Era o Hotel Cambridge”, fusão de ficção e documentário, talvez seja a responsável pela frase mais emblemática deste memorável, contundente e relevantíssimo filme dirigido por Eliane Caffé.

O filme é espetacular por sua capacidade de transcender o cinema e tornar-se um evento cívico, um acontecimento político, uma “experiência de cinema colaborativo em São Paulo que aproxima artistas e intelectuais de movimentos de sem-teto e refugiados. E explica o direito à cidade, na prática.” (Rede Brasil Atual)

Eliane Brum​, em artigo magistral para EL PAÍS Brasil​, disse que o desembarque entre nós deste OVNI cinematográfico equivale a “um acontecimento político-cultural capaz de expressar as tensões e a potência do Brasil atual”:

“O Hotel Cambridge, personagem central do filme, foi na vida real de São Paulo um hotel de luxo construído no final anos 50 com evocações hollywoodianas. Com o crescimento da cidade e o abandono da região central pelos mais ricos, ele testemunhou sua própria decadência. Em 2004, cerrou suas portas e tornou-se mais um esqueleto do centro, um morto insepulto, abandonado ao vazio. Em 2012, foi ocupado pelo movimento dos sem-teto, uma das forças de maior potência da maior cidade do Brasil.

O hotel foi ocupado por cerca de 140 famílias, mais de 240 crianças. A quantidade de meninos e meninas fica explícita em cuidados como um surpreendente e bem organizado estacionamento de carrinhos de bebê. Na dinâmica da especulação imobiliária, que se impõe como uma lógica questionada por poucos, o fato de o Cambridge ter ficado abandonado por oito anos, juntando lixo e empoçando água, tornando-se um criadouro de mosquitos numa época de dengue, zika e chikungunya, não parece ser um problema para a população.

Já quando o velho hotel foi ocupado para a moradia de quem não tem, os ocupantes são tachados de “invasores” – e a urgência de sua denúncia é apagada pelo processo perverso da criminalização.”

(ELIANE BRUM – Leia na íntegra em http://brasil.elpais.com/brasil/2017/03/20/opinion/1490015804_432739.html)

Em “Era o Hotel Cambridge”, baseado em livro de Carla Caffé, o cinema brasileiro alça-se às alturas artísticas que dele se espera por sua gloriosa história pregressa (de Glauber e Sganzerla, a Meirelles e Coutinho, com incontáveis outros gênios que poderiam ser lembrados). É uma obra coloca-nos algumas questões cruciais para o século 21, época em que vivenciamos a pior crise de refugiados no pós-2ª Guerra Mundial (1939-1945) (sobre o tema, leia: Vladimir Safatle) e em que as utopias urbanas têm insistido em sonhar e construir outros mundos possíveis baseados em ideários como “se a cidade fosse nossa….”.

“Ocupar está em voga na cidade de São Paulo. Secundaristas, massa crítica, hortelões comunitários, Ministério da Cultura (MinC), fábricas de cultura, Minhocão, jornadas de junho, ­rolezinhos foram e são fenômenos que apontaram para movimentos de apropriação e ressignificação dos espaços públicos e da vida pública. São insurgências distintas, na maioria um pontapé da juventude. E que, apesar de separadas no mapa, possuem pontos comuns: resistência, prática autônoma e discurso apartidário. Uma experiência chama especial atenção nesse fluxo, principalmente pelo cruzamento entre diferentes tribos urbanas – militantes, artistas, jornalistas, psicanalistas, arquitetos, médicos e refugiados: a Ocupação Cambridge, fruto de um movimento não tão novo, mas importante na história das lutas sociais da cidade, pela moradia digna.” – CAROLINA CAFFÉ em REDE BRASIL ATUAL – Click e leia o artigo na íntegra

Refugiados e imigrantes provenientes do Congo, da Palestina e da Colômbia estão entre os personagens principais desta obra polifônica, rica em diversidade humana, em que Eliane Caffé inscreveu de vez seu nome nos anais da 7ª arte em nosso país. Desde já, a obra merece ser estudada nas aulas de sociologia, já que torna explícita a práxis deste conceito, às vezes compreendido de modo demasiado teórico ou abstrato do  Direito à Cidade, tão essencial na obra da cientistas sociais como Henri Lefebvre e David Harvey (autor de Cidades Rebeldes), e que possui no Brasil um de seus principais pensadores e praticantes na figura do Guilherme Boulos, filósofo e líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto).

Eliane Caffé já havia realizado um filmaço com “Narradores de Javé” (2003), onde um banquete linguístico de deixar contente qualquer fã de Guimarães Rosa, José Cabral de Melo Neto ou Ariano Suassuna somava-se à descrição de um drama social que retorna ao foco, ainda em que transformado e em outras condições, em “Era o Hotel Cambridge”.

Ambos filmes falam sobre aqueles que são refugiados no Brasil, apesar de serem brasileiros; são gente que poderia figurar no tratado “Os Excluídos da História”, da historiadora francesa Michelle Perrot (Ed. Paz & Terra); são aqueles que foram expulsos de seu direito constitucional à moradia, ao território tradicional/originário, ao usufruto da terra que nos é comum.

São gente como a gente, da qual subtraem-se direitos a fórceps. São gente que sofre na carne as incontáveis desumanidades institucionalizadas que em toda parte vem maculando esta Terra que hoje encontra-se toda conspurcada pelas cercas, arames farpados e muros altos edificados pelas elites dos privilégios.

Em “Narradores de Javé”, os refugiados são os moradores do vilarejo de Javé, que está sob ameaça de desaparecer debaixo d’água devido à construção de uma gigantesca hidrelétrica. É surpreendente notar que um filme realizado no ano de 2003 pode hoje soar profético, emblemático de uma era do nosso Brasil que prossegue vigente 15 anos depois. É como se Eliane Caffé tivesse previsto com uma quase miraculosa clarividência, desde o começo do século, que vivenciaríamos os conflitos e antagonismos que hoje nos atravessam com os projetos à la Belo Monte e os fluxos migratórios desordenados e caóticos que hoje ocorrem pelo globo afora, piorados após as desastrosas campanhas da chamada Guerra Contra o Terror no Oriente Médio.

A resistência rural à redução do cidadão ao estado de refugiado interno tinge “Narradores de Javé” de um teor contestatório latente, transformando o filme, que poderia ser visto apenas como excelente entretenimento, a um só tempo humorístico e pedagógico, ao patamar mais alto das obras-de-arte que são também documentos históricos e sócio-culturais. É uma obra que permite-nos, por exemplo, avançar uma compreensão mais cheia de empatia e de entendimento dos dramas atuais como a luta do povo Munduruku contra as hidrelétricas no Rio Tapajós.

Em “Era O Hotel Cambridge”, os refugiados são os moradores da megalópolis paulista que têm negados pelos gestores palacianos da sociedade a chance, constitucionalmente garantida, à casa própria e digna. São aqueles que, obrigados por circunstâncias adversas a ocuparem imóveis abandonados, dão suor e sangue a prédios abandonados com a nova vida que lhe infundem através da ocupação.

A ocupa, força vivificante, resistente, que contesta o império atualmente vigente da especulação imobiliária e da gentrificação, serve como laboratório de outros mundos possíveis. Um mundo onde a propriedade de privilégios que privam concidadãos do mais básico para a existência digna seja reconhecida pelo que é: privilégio é só propriedade abusiva, ilegítima, reconhecível apenas como “roubo”, como dizia Proudhon. O privilégio é um roubo.

Em uma resenha escrita por Isabel Wittmann, ela pontuou muito bem o potencial do filme em pôr em questão o abismo existente entre a Constituição de 1988, em sua dimensão igualitária e em suas pretensões de instaurar justiça social, com nossa realidade atual, tão marcada por direitos que nos são violentamente subtraídos, em especial com a avalanche de retrocessos patrocinada pelas forças sociais e políticas responsáveis pelo Golpe parlamentar-jurídico-midiático de 2016-2017.

“O artigo sexto de nossa Constituição Federal estipula que “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados”. O Estado tem a obrigação de garantir que sua população tenha moradia, mas o que fazer quando os governos não só se recusam a fazê-lo, como reagem no sentido de silenciar movimentos que tentar garantir seus direitos? Essa é uma das muitas questões levantadas em Era o Hotel Cambridge, da diretora Eliane Caffé.

Trabalhando nos limites entre o ficcional e o documental, Caffé registra o cotidiano dos moradores do Hotel Cambridge, edifício abandonado no centro da cidade de São Paulo, destacando as vivências caleidoscópicas de alguns personagens que dão corpo à experiência coletiva. A rotina, as reuniões as tarefas e momentos de engajamentos são retratados com fluidez. Dentre as personagens, o destaque é Carmem, líder real da Frente de Luta por Moradia (FLM), que aqui tem sua força coordenadora descortinada para o público. Mas a narrativa é polifônica: não só se pauta em muitas vozes, como é perceptível a colaboração dos participantes com suas experiências reais nas falas de seus personagens. Em certo momento, Apolo (José Dumont), que organiza um espécie de vlog da ocupação, pergunta “Cadê o foco narrativo?“. Não há um foco pois o protagonista é a luta, sendo cada um apenas uma faceta dela.” (WITTMANN, Isabel)

(http://estantedasala.com/era-o-hotel-cambridge/)

Se o filme oferece-nos motivos para indignação, em especial quando desponta toda a truculência das Tropas de Choque, sob comando do Tucanistão, trata-se de um filme bem mais esperançoso do que, digamos, “Riocorrente” de Paulo Sacramento. A São Paulo focalizada por ambos os filmes é semelhante: é a cidade suja, abandonada, fervilhante de contradições, vista de cima pra baixo, sob a perspectiva dos mais humilhados e ofendidos pelo Sistema; em suma, não é Sampa vista de uma heliponto na Avenida Paulista ou de uma cobertura de 5 milhões no Morumbi, é a Sampa tal como ela é vivenciada nas Crackolândias, favelas e cortiços da maior cidade da América Latina.

“Riocorrente” parece evocar uma Sampa distópica, mais dark que Blade Runner 2049​, onde um dia o Tietê virará nada menos que um rio de fogo – e os protagonistas não vão economizar nas fagulhas e faíscas que tem a fornecer pra que tudo pegue fogo.

“Era o Hotel Cambridge” acredita mais na empatia humana e na força telúrica do amor sob sua encarnação social, expandida para além da cela individual e familiar – aquilo que chama-se comumente de “solidariedade” ou “fraternidade”. O bicho pode estar pegando – a Tucanalha fardada está prestes a chegar, com toda a grosseria brucutu de herdeiros da Ditadura Militar, para cumprir mandato judicial de reintegração de posse com a delicadeza e o respeito humano que viu-se no Pinheirinho (São José dos Campos) – mas o povo, unido, pode até ser vencido, mas luta com união, fortalece-se no esforço de superação das opressões vigentes, reergue-se como Fênix de cada derrota.

Se o Brasil não é um pesadelo totalmente desesperador, é pois existem fortes focos de resistência contra a mercantilização e canalhização completa de nossas vidas. No campo e nas cidades, MSTs e MTSTs, Levantes Populares de Todas as Juventudes, resistências enraizadas dos povos indígenas e quilombolas, artistas com consciência crítica, intelectuais orgânicos atentos aos horrores galopantes, midiativistas e artivistas, dentre outras forças, fazem desta pátria pluritétnica algo muito mais interessante e amável do que a pálida e pútrida propaganda pra patriotário que é a “Ordem e Progresso” do regime Michel Temer​.

Após o golpe de Estado de 2016, “Era o Hotel Cambridge” levanta-se como uma das mais preciosas respostas da Arte Brasileira ao cenário de devastação que está sendo gestado pelos arquitetos da Ponte Para o Futuro (“imaginem quantos milhões de pobres vão morar debaixo dela”, como provoca a tirinha de André Dahmer – malvados​). Este filme pode inclusive ensinar-nos um bocado sobre solidariedade internacionalista, este pilar básico do movimento socialista, que jamais acreditou em emancipação paroquial, mas sim na união de várias emancipações coordenadas, pois onde quer que haja opressão, há resistência e ímpeto de revolução, algo a tecer em união numa grande Internacional Comunista. Com o perdão deste arroubo Trotskysta, voltemos aos refugiados…

Zygmunt Bauman, o finado sociólogo polônes que tanto nos ensina sobre o mundo atual e o drama global dos refugiados, talvez diria, assistindo ao filme de Eliane Caffé, que ele exemplifica perfeitamente o conceito de “sub-classe”, ou de “sub-gente”, que com tanta frequência é mobilizado por nossas elites que tratam vastos contingentes populacionais como simplesmente “matáveis”.

Em “Danos Colaterais – Desigualdades Sociais Numa Era Global” (Ed. Zahar), ele escreveu:

“A condição de subclasse é a de emigrados internos, ou imigrantes ilegais, ‘estranhos de dentro’ – destituídos dos direitos de que gozam os membros reconhecidos e aprovados da sociedade; em suma, um corpo estranho que não se conta entre as partes ‘naturais’ e indispensáveis do corpo social. Algo não diferente de um tumor cancerígeno, cujo tratamento mais sensato é a extirpação…” (BAUMAN, 2011, p. 10)

Esta é a ideologia do nosso inimigo: o fascismo das elites que elegem certos povos, etnias ou territórios como “zonas de sacrifício” (Naomi Klein​), lidando com gente como se fosse sub-gente, meros bichos a serem mandados para matadouros, danos colaterais a aparecerem nos gráficos dos senhores da guerra reunidos em um bunker do FMI…

Como Eliane Brum bem percebeu, “Era o Hotel Cambridge”, sem nenhum panfletarismo explícito – quero dizer, sem nunca ficar parecendo com um discurso de Guilherme Boulos – trabalhou com uma noção crucial para nós no mundo contemporâneo: a fraternidade dos refugiados.

“Esta ideia está explícita na síntese produzida por Carmen Silva, ao abrigar estrangeiros de diversas origens com brasileiros de diversas origens sob o teto da mesma palavra-casa: refugiados”. Ela sinaliza que a identidade só pode existir como atravessamento de múltiplos.

Este é o amálgama que une todos aqueles homens e mulheres, adultos e crianças que se dedicam ao absurdo da vida nos corredores do Hotel Cambridge. O amálgama que coloca os brasileiros como um “fora” mesmo dentro do seu próprio país, os estrangeiros como um “fora” de suas pátrias de origem. Mas todos eles sem refúgio de fato, exceto o do provisório, do efêmero, que constroem num antigo hotel de luxo abandonado. O único refúgio permanente é o desta identidade atravessada que permite que se movam e que confrontem o sistema por “dentro”, eles que são aqueles que foram colocados “fora”. O refúgio permanente é justamente o improvável de sua existência coletiva.

E assim, “Era o Hotel Cambridge” (…) converte-se em uma das obras culturais mais criativas e criadoras dos últimos muitos anos. E uma obra que incorpora a política, na sua expressão mais profunda, como a própria carne do seu fazer. Vida e obra se entrelaçam de tal maneira que o filme está nos cinemas e nas ruas ao mesmo tempo. Para Carmen Silva e moradores do Cambridge, a obra se tornou um instrumento de luta na medida em que se converteu em um meio para se fazer conhecer.” (BRUM)

No ano em que “Eu, Daniel Blake” (de Ken Loach) faturou a Palma de Ouro em Cannes, colocando no epicentro do debate cinematográfico global o tema das desumanidades cometidas pelo neoliberalismo reinante, e em que iniciou de modo tenso a Era Trump na Casa Branca, com ameaças palpáveis de um recrudescimento das guerras imperialistas e de uma piora tanto da crise dos refugiados quanto da insana caminhada para catastróficas mudanças climáticas, o Brasil ergue-se à altura do tempo histórico com um filme que têm algo a dizer a todo o Globo.

EXTRAS


Reportagem TVT


No estúdio TVT, entrevista com Carmem Silva, uma das líderes do Frente de Luta por Moradia (FLM)



Trailer oficial



Metrópolis – TV Cultura


Depoimento de Camila Pitanga
https://www.facebook.com/eraohotelcambridge/videos/1282159991875503/?hc_location=ufi

15M: Um milhão de pessoas tomam as ruas em protesto contra o Pacote de Maldades do regime golpista

Cerca de 1 milhão de brasileiros, segundo Brasil de Fato (http://bit.ly/2mCf6vQ), tomaram as ruas neste 15 de Março de 2017. A maré torrencial de participação contestatória deu-se em protesto contra a avalanche de retrocessos propostas pelo (des)governo instaurado após o golpeachment.

A cidadania insurgente manifestou-se em um dia histórico de greve e mobilização nacional, com foco no repúdio à Reforma da Previdência. Parte do “Pacote de Maldades” proposto pelo regime golpista de Michel Temer, a (D)eforma Previdenciária propõe aquilo que o humorista José Simão chamou de “aposentadoria póstuma”: morra primeiro, aposente depois.

Caso o Congresso Nacional aprove a medida, para ter direito à aposentaria integral o trabalhador precisará de 49 anos de contribuição ininterrupta e idade mínima de 65 anos, tanto para homens quanto para mulheres. Sobre o tema, o filósofo Vladimir Safatle escreveu com clareza na Folha de S. Paulo: “Como em várias regiões do Brasil a expectativa de vida não chega a 65 anos, a contribuição previdenciária será, para boa parte das pessoas, uma pura e simples forma de espoliação de seus rendimentos, já que elas morrerão antes de se aposentar.”

O argumento é ecoado em um vídeo, que viralizou nas redes, bolado pela frente Povo Sem Medo em parceria com o ator Wagner Moura. Neste vídeo, critica-se com sarcasmo: “Vão transformar o INSS em uma funerária: as pessoas vão se aposentar no caixão.”

Em ato que reuniu mais de 200.000 mil pessoas na Avenida Paulista (e não mereceu uma mísera linha ou foto no jornal Estadão, que realizou uma omissão criminosa e suína que o faz merecedor da alcunha de membro do P.I.G.), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou: “está ficando cada vez mais claro que o golpe dado neste país não foi só contra a [ex-presidenta] Dilma Rousseff e os partidos de esquerda, mas para colocar um cidadão sem nenhuma legitimidade para acabar com os direitos trabalhistas e com a Previdência Social” (http://bit.ly/2mQgmMV).

Goiânia, 15M

ASSISTA: A MARÉ: Goiânia, 15 de Março de 2017
(Documentário, Curta-metragem, 14 minutos.)

Neste documentário curta-metragem A Maré, de 14 minutos, confiram um pouco dos agitos nas ruas da capital de Goiás neste 15M, quando uma significativa manifestação popular tomou conta do centro da cidade. Estima-se que mais de 15 mil goianienses participaram do ato, que reuniu ativistas de vários movimentos sociais e centrais sindicais, além de estudantes secundaristas e universitários, professores e servidores da educação pública, funcionários dos Correios e de empresas públicas como a CELG, com forte presença do Povo Sem Medo que têm resistido ao golpe e seu séquito de retrocessos.

Diante de uma corja golpista e corrupta de cleptocratas elitistas, a população do Brasil vê-se diante da necessidade histórica de levantar-se contra o tsunami de retrocessos que pretendem, para lembrar a boutade de Millôr Fernandes, perpetuar nosso status de país “com um longo passado pela frente”. Ou, como disse o humorista André Dahmer, permitiremos a instalação da grotesca Ponte Para O Futuro: “imaginem quantos pobres vão morar debaixo dela!”

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“A Maré” é um filme de Eduardo Carli de Moraes; uma produção independente d’A Casa de Vidro – Livraria e Produtora Cultural [http://www.acasadevidro.com]. Com falas de Renato Costa, Pedro Henrique Melo Albernaz, Lucas Nunes, Jules Groucho Maigret, Davi Maciel, dentre outros. Trechos musicais de Paulinho da Viola e Anita Tijoux (nenhuma violação dos direitos autorais das obras musicais esteve entre nossas intenções; trechos das canções foram utilizados para ilustrar as imagens de modo lúdico e sugestivo e esta obra audiovisual não tem nenhum fim lucrativo).

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