TUA AUSÊNCIA É BEM REAL – Retrato poético de Ernesto ‘Che’ Guevara (1928 – 1967) com versos de Neruda, Galeano, Casaldáliga, Benedetti, dentre outros

PRELÚDIO BIOGRÁFICO:

CHE MORREU COMO QUERIA: LUTANDO
por Analdino Rodrigues Paulino

El Che – Ernesto Guevara de la Serna – filho de Ernesto Guevara Lynch e Célia de la Serna, nasceu em Rosário, Argentina, a 14 de junho de 1928 e foi assassinado no dia 9 de outubro de 1967, no povoado boliviano de Higueras, aos 39 anos de idade.

Desde jovem, foi grande leitor de literatura (Baudelaire, Lorca, Antonio Machado, Pablo Neruda, tendo este último o influenciado muito) e também de política e filosofia. Ainda adolescente, Che percorreu de bicicleta todo o Norte e Oeste da Argentina, num total de 4.700 km.

Quando já era universitário, viajou por quase toda a América Latina, usando de motocicletas a balsas, ao lado de seu amigo Alberto Granados. Para pagar as despesas de viagem, trabalharam como carregadores, lavadores de prato, marinheiros e médicos, o que já revelava sua coragem, espírito de independência e desprezo pelo perigo.

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Foi a partir dessa viagem que começou a sentir e se expressar como um latino-americano, e não apenas como argentino, quando viu o desamparo, a exploração e a miséria como traço característico do nosso continente. Em 1953, quando concluiu o doutorado em Medicina, rumou para a Venezuela, onde ficara seu amigo Granados, para trabalhar na pesquisa da lepra.

Quando conheceu o advogado argentino Ricardo Rojo (autor do livro Meu Amigo Che), este lhe fez um convite decisivo: “Vem comigo à Guatemala, porque ali vai ter lugar uma verdadeira Revolução Social!” Che desembarcou na Guatemala a 24 de dezembro de 1953, acompanhado por Rojo e do Dr. Eduardo Garcia. Na Guatemala, o presidente Jacobo Arbenz Guzmán desenvolvia um governo Revolucionário do qual Che participou através do Instituto Nacional da Reforma Agrária (Folha de S. Paulo, 25/01/80)

488611c55943bc33a3c45f6187d833c1Em 1954, um golpe militar, organizado pelos Estados Unidos e dirigido pelo coronel Castillo Armas, derrubou o governo de Arbenz. Todas as tentativas de resistência fracassaram, inclusive as de Che. Ernesto Guevara foi, então, para o México, onde desempenhou diversos trabalhos, como fotógrafo ambulante nas praças públicas e vendedor de livros da Editora Fondo de Cultura Económica.

Através de concurso, passou a trabalhar no maior hospital do país, como médico de doenças alérgicas, chegando a pensar em uma cátedra universitária. Foi nesse hospital que conheceu o paciente Raúl Castro. Em 1955, Raúl o leva ao apartamento de Maria Antônia, uma espécie de albergue dos cubanos refugiados, para conhecer Fidel Castro.

É o próprio Che quem relata: “Conheci Fidel em uma daquelas frias noites mexicanas e recordo que nossa primeira discussão versou sobre política internacional. Conversamos toda a noite e, ao amanhecer, já era o médico de sua futura expedição.”

Com Fidel

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5 POEMAS SOBRE CHE GUEVARA [EXCERTOS]

“Matar crianças, assassinar mineiros,
Caçar índios, disparar os fuzis
contra aqueles que levantam vozes
e braços
em protesto
talvez fosse fácil, e também semear a morte
a torto e a direito de aviões
como a fome a semeia lá embaixo.

Mas não é fácil atirar no coração
do Guerrilheiro ferido
que se agiganta.
É difícil atirar assim,
no largo peito estremecido
como que por marés de multidões clamorosas…

As vozes
que ordenaram o crime
já sabem que emudecerão
em lenta podridão.
E não mata o disparo
O coração.
O Guerrilheiro morto vive.

Dos Andes desce seu sangue em labaredas,
vulcânica lava redentora
que acende os territórios da fome da injustiça
e corre pelas veias de novos guerrilheiros
com seu ardente apelo que não cessa.

Che vive.

Em vão os carrascos
seqüestram assustados o corpo morto
do Guerrilheiro vivo,
e o sepultam em matagais ignorados;
suas barbas florescem incansáveis
em muitos rostos jovens.
A pele brota em muitos corpos generosos
que desafiam o sol, o vento,
as montanhas, as balas.

E não haverá rocha que consiga deter
esses ossos, inquietos,
enquanto houver uma única injustiça
a combater na terra.”

Angel Augier

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CONSTERNADOS, FURIOSOS
de Mário Benedetti

Assim estamos
consternados
furiosos
embora esta morte seja
mais um desses absurdos previsíveis.

Envergonha olhar
os quadros
as poltronas
os tapetes
tirar uma garrafa da geladeira
batucar as três letras mundiais de teu nome
nesta rígida máquina
que nunca
nunca esteve
com a fita tão pálida…
envergonha sentir frio
e chegar-se à lareira como sempre
sentir fome e comer
essa coisa tão simples
ou ligar a vitrola e escutar em silêncio
especialmente se for um quarteto de Mozart
envergonha o conforto
até a asma envergonha
quando você comandante está caindo
metralhado
fabuloso
nítido
você é a nossa consciência arrebentada.

Dizem que incineraram
toda a tua vocação
menos um dedo.

Basta para apontar-nos o caminho,
para acusar o monstro e suas brasas,
basta para apertar novamente os gatilhos…

Você está morto
vivo
está caindo
está nuvem
está chuva
está estrela
onde você estiver
e se você estiver quando você chegar
Aproveite afinal
e respire tranquilo
encha de céus os seus pulmões.

Onde você estiver
e se você estiver
quando você chegar
vai ser bem triste que não haja Deus
mas haverá outros
é claro que haverá outros
dignos de receber-te
comandante.

* * * * *

TRISTEZA NA MORTE DE UM HERÓI
De Pablo Neruda (Prêmio Nobel de Literatura)

Nós que vivemos esta história
esta morte e ressureição
de nossa esperança enlutada,
os que escolhemos o combate
e vimos crescer as bandeiras
soubemos que os mais calados
foram os nossos únicos heróis
e que depois das vitórias
chegaram vociferantes
a boca cheia de jactância
e de proezas salivares.

O povo moveu a cabeça;
e voltou o herói ao seu silêncio
Mas o silêncio se cobriu de luto
até afogar-nos nesse luto
quando morria nas montanhas
o fogo ilustre de Guevara.
O comandante terminou
assassinado num barranco.
Ninguém abriu a boca.
Ninguém chorou nos povoados índios.
Ninguém subiu às torres das igrejas.
Ninguém levantou fuzis,
e cobraram a recompensa
aqueles a quem veio salvar
o comandante assassinado.

O que houve, medita o pesaroso,
com estes acontecimentos?

E não se diz a verdade
Porém se cobre com papel
esta desgraça de metal.
Mal se abrira o roteiro
quando chegou a derrota
como um machado que caiu
na cisterna do silêncio.

Bolívia voltou ao seu rancor,
a seus enferrujados gorilas,
à sua miséria intransigente,
e como bruxos assustados
os sargentos da desonra,
os generaizinhos do crime
esconderam com eficiência
o cadáver do guerrilheiro.

Como se o morto os queimasse.

A selva amarga engoliu
os movimentos, os caminhos,
e onde passaram os pés
da milícia exterminada
hoje os cipós aconselharam
uma voz verde de raízes
e o veado selvagem voltou
à folhagem sem estampidos.

* * * * *

Alberto Korda

Fotografia de Alberto Korda.

CHE GUEVARA
por Dom Pedro Casaldáliga

Eu, Che, prossigo crendo
na violência do amor:
tu próprio dizias que
é preciso endurecer
sem perder nunca a ternura.”

(…)
Escuto, no transistor, como te canta
a juventude rebelde
enquanto o Araguaia pulsa a meus pés,
como uma artéria viva,
transito pela lua quase cheia.
Apaga-se toda luz. E é só noite.
Rodeiam-me os amigos distantes vindouros
(“Pelo menos tua ausência é bem real”,
geme outra canção…)

Descansa em paz. E aguarda, já seguro,
Com o peito curado
Da asma do cansaço;
Limpo de ódio o olhar agonizante;
Sem mais armas, amigo,
que a espada despida de tua morte.
(morrer sempre é vencer desde que um dia
Alguém morreu por todos, como todos,
Matado, como muitos…)

Nem os “bons”-de um lado-,
Nem os “maus”- do outro-,
Entenderão meu canto.
Dirão que sou apenas um poeta.
Pensarão que a moda me ganhou.
Recordarão que sou apenas um padre “novo”.
Nada disso me importa!
Somos amigos
E falo contigo agora
Através da morte que nos une;
Estendendo-te um ramo de esperança,
Todo um bosque florido
De ibero-americanos jacarandás perenes,
Querido CHE GUEVARA!!

* * * *

Che, un hombre nuevo (Ernesto Guevara con Aleida March y sus hijos)

O NASCEDOR
(Eduardo Galeano, Uruguai, 1940-2015)

Por que será que o Che
tem esse perigoso costume
de seguir sempre
nascendo?
Quanto mais o insultam,
o manipulam,
o traem, mais nasce.
Ele é o mais nascedor de todos!
Não será porque o Che
dizia o que pensava,
e fazia o que dizia?
Não será por isso que segue
sendo tão extraordinário,
num mundo em que
as palavras e os atos
raramente se encontram?
E, quando se encontram,
não se saúdam,
porque não se
reconhecem?

(trad. de Jeff Vasques | www.eupassarin.wordpress.com)

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CHE GUEVARA, POETA

VELHA MARIA, VAIS MORRER
(Che Guevara, 1928-1967)
Velha Maria, vais morrer:
Quero falar contigo seriamente.Tua vida foi um rosário completo de agonias,
não houve homem amado nem saúde nem dinheiro,
apenas a fome para ser compartilhada.
Mas quero faler-te da tua esperança,
das três diversas esperanças
que tua filha fabricou sem saber como.Toma esta mão de homem que parece de menino
nas tuas mãos, polidas pelo sabão amarelo.
Abriga teus calos duros e teus nós puros dos dedos
na suave vergonha de minhas mãos de médico.

Escuta, avó proletária:
crê no homem que chega,
crê no futuro que nunca verás.

Não rezes ao deus inclemente
que toda uma vida desmentiu tua esperança;
não peças clemência à morte
para ver crescer tuas pardas carícias;
os céus são surdos e o escuro manda em ti.
Mas terás uma vermelha vingança sobre tudo,
juro pela exata dimensão de meus ideais:
todos os teus netos viverão a aurora.
Morre em paz, velha lutadora.

Vais morrer, velha Maria:
trinta projetos de mortalha
dirão adeus com o olhar
num destes dias em que te vais.

Vais morrer, velha Maria:
ficarão mudas as paredes da sala
quando a morte conjugar-te com a asma
e copularem seu amor na tua garganta.

Essas três carícias construidas de bronze
(a única luz que alivia a tua noite),
esses três netos vestidos de fome
chorarão os nós destes dedos velhos
onde sempre encontravam um sorriso.
E isso será tudo, velha Maria.

Tua vida foi um rosário de magras agonias,
não houve homem amado, saúde, alegria
apenas a fome para ser compartilhada.
Tua vida foi triste, velha Maria.

Quando o anúncio do descanso eterno
suaviza a dor de tuas pupilas
e quando a tua mão de perpétua borralheira
absorve a última e ingênua carícia,
pensas neles… e choras,
pobre velha Maria!

Não, não o faças!
Não rezes ao deus indolente
que toda uma vida desmentiu a tua esperança,
nem peças clemência à morte,
que tua vida foi horrivelmednte vestida de fome
e acaba vestida de asma.

Mas quero anunciar-te,
na voz baixa e viril das esperanças,
a mais vermelha e viril das vinganças.
Quero jurá-lo pela exata
dimensão de meus ideais.

Toma esta mão de homem que parece de menino
nas tuas mãos, polidas pelo sabão amarelo.
Abriga teus calos duros e teus nós puros dos dedos
na suave vergonha de minhas mãos de médico.

Descansa em paz, velha Maria,
descansa em paz, velha lutadora:
todos os teus netos viverão a aurora.
EU JURO!

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JAMAIS PODERÃO APRISIONAR NOSSOS SONHOS – Sobre o imperativo da união em torno da bandeira #LulaLivre

EDITORIAL A CASA DE VIDRO – “Acho que a coisa mais gostosa da nossa passagem pela Terra é a convivência fraternal na diversidade”, diz Lula em seu livro “A Verdade Vencerá” (Boitempo, 2018, p. 105). O elogio da democracia, por parte de um dos estadistas mais populares da terra, é também a apologia da Política, antídoto contra a guerra, campo de diálogos e deliberações no espaço público, polvilhado de contradições:

“Em vez de ter um sem-terra e um ruralista se matando no campo de batalha, é muito mais bonito vê-los digladiando no Congresso Nacional, argumentando, provando tudo, votando… E vença aquele que tem melhor argumento. Eu acredito nisso. Acho que no Brasil, lamentavelmente, a democracia não é a regra, é exceção.

E isso é triste, porque eu jamais imaginei, depois de 1988, que a gente teria outro golpe. Eles civilizaram o golpe, agora não precisa ter guerra civil. Não precisa de golpe militar. Você faz dentro da lei: constrói a maioria, consegue ganhar a opinião pública, tem a imprensa para prestar o serviço. A imprensa presta o serviço, você então cria uma maioria da sociedade contra o governo, cria uma maioria dos parlamentares contra o governo e dá legalidade a tudo. E acontece o que estamos vendo no Brasil.”

O Golpe de Estado que se processa no Brasil desde 2016 teve no impeachment sem crime de responsabilidade, perpetrado contra Dilma Rousseff, apenas o seu primeiro episódio: naquela ocasião, os mais de 54 milhões de votos da presidenta re-eleita foram jogados no lixo, com o pretexto espúrio das “pedaladas fiscais” (que nunca foram nem nunca serão motivo para considerar um governante como criminosamente irresponsável).

A Aliança Golpista, sem precisar de tanques, pôde congregar ao seu redor uma maioria parlamentar (essencialmente ligada à Bancada BBB), um respaldo midiático fornecido pelo empresariado da comunicação de massas (com especial protagonismo daquele ovo da serpente que a Ditadura chochou e protegeu em seu ninho, a Rede Globo), além do apoio de setores da sociedade civil que foram cooptados por movimentos como MBL e Vem Pra Rua, servindo de úteis manifestoches da intentona putschista.

Mas ninguém dá um Golpe de Estado para simplesmente realizar novas eleições democráticas e justas, com o risco explícito da 5ª vitória consecutiva do PT – Partido dos Trabalhadores para a presidência da República – donde a necessidade do aprisionamento de Lula, nova fase do velho golpe que pôs Michel Temer no comando de um país que, ao invés de construir uma Ponte Para o Futuro, só está despencando no abismo.

“O mais grave, diz Lula, é a falta de capacidade de indignação da sociedade. Mas não é só com a democracia. É a falta de indignação com gente que está dormindo na rua. É a falta de indignação da sociedade quando eles acabam com investimento em ciência e tecnologia, quando querem acabar com o Fies, quando querem acabar com o Prouni, quando acham que fazer doutorado no estrangeiro é gasto desnecessário. E não é gente pobre, ão. Cadê a academia se manifestando contra a retirada de dinheiro de ciência e tecnologia?” (p. 105)

Este sentimento de indignação que inflama Lula e que o motiva à ação hoje se soma à revolta sentida pelo ex-presidente pela enxurrada de calúnias e pela perversa perseguição de que ele é alvo. O sentimento de um cara injustiçado está impregnado em todas as páginas do livro: “o sentimento de injustiça, de canalhice, da mentira mais escabrosa que se inventou neste país”, queima no peito de Lula contra esta “Elite do Atraso” de que nos fala Jessé Souza. “Eles não aceitaram a ascensão social dos oprimidos neste país.” (p. 79)

O cárcere que fez de Lula um preso político do regime nascido do golpeachment não diz respeito a um triplex no Guarujá, tem a ver com o futuro político de Lula, que trata-se de aniquilar, até mesmo porque a candidatura lulista para as Eleições de Outubro de 2018 provavelmente incluirá a proposta de uma nova Assembléia Constituinte, além de um referendo revogatório que cancele todos os atos do governo ilegítimo nascido do golpe, a começar pela Reforma Trabalhista e pela Emenda Constitucional do Congelamento de Investimentos Públicos em Saúde e Educação por 20 anos. Lula diz:

“Eu sempre tento me colocar do lado dos adversários. Eles devem ficar pensando assim: ‘A gente inventou uma fraude para dar o golpe e a gente conseguiu dar o golpe, tiramos a Dilma. E dizemos tudo isso pro Lula voltar? Correndo o risco de ele levar a Dilma de volta pro governo?’ Porque eu de fato levaria, para ela fazer coisas que sabe fazer como ninguém. Eles correriam o risco de eu montar um ministério ainda mais forte que o da primeira vez? Porra [bate na mesa], se tem uma coisa que o povo gosta é de viver bem. Ninguém se conforma de ganhar pouco, ninguém se conforma de comer mal. As pessoas gostam tanto de viver bem que o Sérgio Moro, quando acha que não ganha o que precisa, pede auxílio-moradia [risos].” (p. 69)

A crítica que se faz às práticas lulistas, ao PT no poder, de ter propiciado a inclusão de mais de 50 milhões de pessoas na economia, através de seus programas sociais, mas que o fez através de uma perspectiva que pensa o ser humano mais como consumidor do que como cidadão, Lula responde: “Eu pensei no cidadão. Porque o cidadão que não pode consumir não é porra nenhuma. O cidadão que não pode comer, não pode vestir e não pode beber é pária, não é cidadão.”

Bertolt Brecht aplaudiria.

Nos dias lendários que precederam sua prisão, Lula tornou-se um ícone histórico de estatura e magnitude similar à de um Martin Luther King, Jr. – cujo discurso “I Have a Dream” inspirou o seu próprio discurso emocionado com várias frases começando com “Eu Sonhei…”. Lula também recuperou o espírito de Che Guevara, citou Pablo Neruda, disse que “podem cortar todas as flores e não vão parar a primavera”. Lula quis nos dar um alento de esperança nestes tempos distópicos e desesperadores onde nossos direitos mais básicos estão sendo lançados no lixo da história pelo elitismo plutocrático que assaltou o poder. Lula nos disse que o problema do poder não é ele, um homem de carne-e-osso, mas o ideal que ele representa e que defendeu com sua vida. O ideal que sua morte não irá matar.

O problema do golpe não é Lula, o problema do golpe somos nós. Pois somos milhões de Lulas e não se pode encarcerar sonhos. Somos milhões de Lulas e não se pode deixar as idéias presas detrás de grades. Ainda que as forças golpistas o mantenham numa cela, incomunicável, torturado pela solidão, impedido de participar da eleição, nós aqui fora seremos Lula Livre. Ele respirará por nossos pulmões, andará por nossas pernas, gritará por nossas bocas, chorará por nossos olhos, lutará com nossos punhos. Pode ser que a gente vá perder, mas Darcy Ribeiro já disse tudo: há muitas lutas em que nós odiaríamos estar do lado dos vencedores, em especial quando eles são uma gangue perversa como esta que tem nos golpeado dia a dia.

É um tempo histórico que não nos permite o luxo da isenção. Há 3 lições de 3 grandes mestres que falam sobre isso com clareza. Desmond Tutu diz que “se você é neutro em situações de opressão, você escolheu o lado do opressor.” Florestan Fernamdes diz que “não existe neutralidade possível e o intelectual deve optar entre o compromisso com os exploradores ou com os explorados.” Paulo Freire diz que não existe neutralidade ideológica e que todos tem ideologia, resta saber: “a sua base ideológica é inclusiva ou excludente?” Por isto, diante das injustiças históricas, não vejo possibilidade de estar ao lado dos “isentões”, já que a justiça é construção coletiva que demanda nosso engajamento.

“Querem me prender? Eu falarei pela voz de vocês. Eu andarei pela perna de vocês. Eu pensarei pela cabeça de vocês.”

Agora o problema deles não é Lula, o problema deles somos nós.

#LulaLivre!

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Eduardo Carli de Moraes para A Casa de Vidro
www.acasadevidro.com || 11 de Abril de 2018

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“…sempre que os governos decidem impor programas radicais de livre mercado, o tratamento de choque tem sido o seu método preferido.” (Naomi Klein)

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Neoliberalismo e Violência: o golpe militar no Chile em 1973
& outras reflexões sobre a imposição brutal do “Livre Mercado”

Leia a matéria completa e inédita @ Depredando o Orelhão: http://migre.me/ccfUI

“In order to stablish conditions for free-market,
and in order to sustain free-market,
you need quite a lot of violence.”

SLAVOJ ZIZEK

O neoliberalismo, antes de ser implantado nos países capitalistas avançados, capitaneado por Tatcher no Reino Unido, Reagan nos EUA e Deng Xiaoping na China – como exposto em minúcia no livro Neoliberalismo de David Harvey (2008) – utilizou o Chile como seu “laboratório” experimental. Salvador Allende, desde sua eleição à presidência em 1970, havia realizado transformações amplas na sociedade chilena, pavimentando o caminho para uma sociedade socialista. Suas ações iam na direção oposta ao que recomendam os cânones neoliberais: ao invés de privatizações e desregulamentações favoráveis ao livre-mercado, o governo Allende trabalhou em prol da nacionalização de empresas, minas e terras.
Allende expropriou 15 milhões de hectares de terras que estavam concentradas nas mãos de latifundiários e as redistribuiu [vide nota 01 no fim do texto].Estatizou todos os bancos e retornou o controle de quase todas as fábricas ao comando dos próprios operários. Defendeu com punho-de-ferro a autonomia do Chile diante dos exploradores estrangeiros, em especial os EUA, que viam com muita desconfiança estas “iniciativas marxistas” que se assemelhavam a muitas instauradas em Cuba após a Revolução de 1959. Os militares, o partido Democrata-Cristão e os yankees fizeram tudo para boicotar e desestabilizar o regime de Allende, que resistiu por mais de 3 anos, respaldado por um apoio popular tão intenso e imenso. Com frequência massas que superavam 100 mil pessoas tomavam as ruas bradando a uma só voz: “Allende, Allende, el pueblo te defiende!” ou “Allende, tranquilo, o povo está contigo!”

O Chile havia vivido 41 anos de regime democrático quando, no fatídico 11 de Setembro de 1973, o presidente democraticamente eleito Allende é assassinado, o palácio de La Moneda em Santiago é bombardeado e um golpe militar instaura a ditadura Pinochet. Como nos lembra Naomi Klein, foi determinante neste evento histórico a ação nos bastidores de Milton Friedman, “considerado o economista mais influente do último meio século” (KLEIN: 2007, p. 15), um dos papas da doutrina neoliberal:

“Milton Friedman aprendeu a explorar os choques e as crises de grande porte em meados da década de 1970, quando atuou como conselheiro do ditador chileno, o general Augusto Pinochet. Enquanto os chilenos se encontravam em estado de choque logo após o violento golpe de Estado, o país sofria o trauma de uma severa hiperinflação. Friedman aconselhou Pinochet a impor uma reforma econômica bastante rápida – corte de impostos, livre-comércio, serviços privatizados, corte nos gastos sociais e desregulamentação. (…) Ficou conhecida como ‘a revolução da Escola de Chicago’, pelo fato de que muitos economistas de Pinochet tinham estudado sob a orientação de Friedman na Universidade de Chicago. (…) Desde então, sempre que os governos decidem impor programas radicais de livre mercado, o tratamento de choque [the shock doctrine] tem sido o seu método preferido.” (KLEIN, A Doutrina do Choque, p. 17)

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PROSSIGA LENDO… http://migre.me/ccfUI. O post inclui FILMES COMPLETOS como o curta-metragem de KEN LOACH sobre o 11 de Setembro Chileno; 3 documentários de “A BATALHA DO CHILE”, de Patricio Guzman, legendandos em português; A DOUTRINA DO CHOQUE, filme de M. Winterbottom baseado no livro de Naomi Klein… e muito mais! Siga viagem >>> http://migre.me/ccfUI